Quando estamos doentes, afinal não temos outro remédio senão tomar remédio.
O remédio, aliás, sempre faz bem. Ou
faz bem ao doente que o toma com muita fé; ou ao droguista que o fabrica com muito
carinho; ou ao comerciante que o vende com um pequeno lucro de 300 por cento.
Mas apesar do bem que fazem, devemos convir que há remédios verdadeiramente
repugnantes, que provocam engulhos e violentas reações de repulsa do estômago.
Como devemos tomar esses remédios repugnantes? Aí está o problema que
procuraremos resolver para orientar os nossos dignos e anêmicos leitores.
O melhor meio de vencer as náuseas, quando temos que ingerir um remédio
repelente, consiste em recorrer à lógica dos rodeios, adotando os métodos indiretos,
até chegar à auto-sugestão, transformando assim o remédio repugnante numa coisa que
seja agradável ao paladar. Numa palavra, devemos tomar o remédio com cerveja, por
exemplo.
Como devemos proceder para chegarmos a esse magnífico resultado?
É indispensável
comprar, antes do remédio, uma garrafa de cerveja. Depois, é necessário bebê-la
devagar, saboreando-a, para sentir-lhe bem o gosto. Liquidada a primeira garrafa, pedimos
outra cerveja. Esta
vamos tomá-la de outra forma, também devagar, mas com a ideia posta no
remédio, cuja lembrança naturalmente nos provocará asco. Para voltarmos ao normal,
encomendamos uma terceira garrafa, com a qual, lembrando-nos sempre do remédio, iremos
dominando e vencendo a repugnância. Na altura da quinta ou undécima garrafa, nós já
estaremos convencidos de que o gosto do remédio deve ser muito semelhante ao da cerveja
e, assim, já poderíamos beber calmamente o remédio como cerveja. Mas, como não temos o
remédio no momento e já não temos muita força nas pernas para ir à farmácia, então
continuamos a beber a infusão de lúpulo e cevada, até chegarmos a esta notável
conclusão: se é possível chegar a se tomar um remédio tão repugnante como cerveja,
muito mais lógico será que passemos a tomar cerveja como remédio, porque a ordem dos
fatores não altera o produto, quando está convenientemente engarrafado.
Barão de Itararé
Texto extraído do livro "Máximas e Mínimas do Barão de Itararé", Editora Record - Rio de Janeiro, 1986, pág. 33, uma coletânea organizada por Afonso Félix de Sousa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário