A Cinemateca Francesa programou para o período entre 18 de março e 18 de maio deste ano uma mostra com um panorama do cinema brasileiro, desde as origens até hoje (aqui: http://tinyurl.com/pepqo5v). São 72 títulos, e uma mostra tão ampla dificilmente deixaria de mostrar alguns dos chamados filmes inevitáveis, desde pioneiros como Mário Peixoto e Humberto Mauro, passando pela chanchada carioca, a Vera Cruz paulista, o Cinema Novo, o cinema marginal, o documentário, a “Retomada”, etc. Deixo aos diretores o chororô de “deixaram Fulano de fora”. Alguém sempre vai ficar de fora.
Em matéria de cinema nordestino (o que inclui conteúdo, não só origem de produção) temos além dos ciclos de cangaço, etc., filmes como Cinema, aspirina e urubus de Marcelo Gomes, Cabra marcado para morrer de Eduardo Coutinho e O Som ao Redor de Kleber Mendonça Filho. Devo lembrar também A hora da estrela de Suzana Amaral, que revelou a paraibana Marcélia Cartaxo. O que me surpreendeu foi o grande número de filmes marginais do tempo do chamado “cinema udigrudi”, inclusive títulos obscuros como Hitler 3o. Mundo de José Agrippino de Paula e Os Monstros de Babalu de Elizeu Visconti, ao lado de outros mais estudados pela crítica, como os de Julio Bressane (Matou a família e foi ao cinema, etc.), Rogério Sganzerla (O Bandido da Luz Vermelha, etc.) e outros.
Me surpreendeu também a inclusão de filmes de Zé do Caixão. Enquanto o cinema udigrudi, com sua sujeira narrativa, seu niilismo político e seu deboche cruel me parecem até corresponder a um certo gosto da crítica francesa, sempre achei que Zé do Caixão nunca teria por lá a mesma recepção que tem nos EUA, onde há um certo culto em torno de “Coffin Joe” e sua filmografia. A mostra parece ter sido organizada pelos pesquisadores ligados à Cinémathèque. É sempre útil estudar o modo como os outros nos estudam. O “recorte”, como se diz, já é uma forma de crítica, uma tentativa de organizar diferentes tipos de prioridade.
A crítica francesa já foi acusada como responsável por muitos cacoetes do Cinema Novo; aquilo que os franceses elogiavam num ano era repetido por muita gente nos filmes do ano seguinte. O que tanto pode ser uma coisa ruim como uma coisa boa, porque o que vale, sempre, é o resultado na tela. Acontece também com os EUA: muitas coisas boas produzidas lá eram esnobadas na terra natal e foram os franceses que souberam lhes dar valor. De Edgar Allan Poe ao jazz, muita coisa norte-americana só ganhou a estatura que tem hoje depois que os franceses assinaram embaixo. O olho francês sobre o nosso cinema pode continuar a ser uma influência positiva.
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo
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