sábado, 10 de janeiro de 2015

Charneca em flor

Enche o meu peito, num encanto mago, 
O frémito das coisas dolorosas...
Sob as urzes queimadas nascem rosas... 
Nos meus olhos as lágrimas apago...

Anseio! Asas abertas! O que trago 
Em mim? Eu oiço bocas silenciosas 
Murmurar-me as palavras misteriosas
Que perturbam meu ser como um afago!

E, nesta febre ansiosa que me invade,
Dispo a minha mortalha, o meu burel,
E já não sou, Amor, Soror Saudade...

Olhos a arder em êxtases de amor, 
Boca a saber a sol, a fruto, a mel: 
Sou a charneca rude a abrir em flor!



Florbela Espanca

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