domingo, 7 de fevereiro de 2010

Após CNBB chamar Lula de "novo Herodes", plano de direitos humanos gera onda de protestos da igreja e "beijaço" em SP


A promessa do ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, de retirar a descriminalização do aborto do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, não foi suficiente nem para agradar definitivamente setores conservadores da igreja, tampouco para apaziguar os ânimos de defensores das medidas previstas no plano.

Nos panfletos, revelados pela reportagem do UOL Notícias, o Regional Sul 1 da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), afirmou que, a exemplo do rei Herodes, aquele que ordenou a "matança dos inocentes" na Bíblia Sagrada, o presidente da República faria o mesmo extermínio, ao assinar o 3º Programa Nacional de Direirtos Humanos contendo a descriminalização do aborto

A internet tornou-se o palco principal da controvérsia. Enquanto parte da igreja católica continua a contestar outros três pontos polêmicos do plano com uma série de artigos publicados online, usuários da ferramenta de microblog Twitter promovem um encontro em São Paulo para defender sua manutenção.

A onda de protestos por parte da igreja teve início com um panfleto revelado pela reportagem de UOL Notícias, em que o Regional Sul 1 da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) classifica Lula como “novo Herodes”. Segundo os bispos, a exemplo do rei que ordenou a "matança dos inocentes" na Bíblia Sagrada, o presidente da República faria o mesmo extermínio, ao assinar o 3º PNDH contendo a descriminalização do aborto.

Os pontos contestados são, além da descriminalização do aborto, a união civil entre pessoas do mesmo sexo, direito de adoção por casais homoafetivos e a proibição da ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União. "Herodes mandou matar algumas dezenas de recém-nascidos (Mt 2,16). Com esse decreto, Lula permitirá o massacre de centenas de milhares ou até de milhões de crianças no seio da mãe!", incita o documento.

Agora, 67 bispos católicos, entre eles dom Eugênio Sales, arcebispo emérito do Rio de Janeiro, decidiram mover um abaixo-assinado contra o que chamam de “métodos autoritários” do governo. O documento afirma que o plano pretende fazer passar por direito universal a vontade da minoria.

Um dos trechos do abaixo-assinado remete a artigo em que o cardeal dom Geraldo Majella Agnelo, primaz do Brasil, fala em “equívoco para o desenvolvimento”. “Fazer aprovar por decreto o que já foi rechaçado repetidas vezes por órgãos legítimos traz à tona métodos autoritários dos quais com muitos sacrifícios nos libertamos ao restabelecer a democracia no Brasil na década de 80”, afirma.

A onda de artigos dos bispos católicos virou corrente na internet. Dom Orlando Brandes, arcebispo de Londrina (PR) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, afirma que “é inadmissível que a revisão do programa, agora feita às pressas pelo governo, tenha interesses eleitoreiros”. “Na verdade o que deve ser revista é a ética laicista e contrária a vida, ao matrimônio e à família, defendida neste programa. Não se pode em nome dos direitos humanos defender o direito de matar e de destruir o matrimônio e a família.”

Dom Aldo Di Cillo Pagotto, arcebispo da Paraíba, chama o plano de “pacote ideológico do governo” ao criticar outros pontos controversos, a tentativa de controle da imprensa e a não repreensão às invasões de terra. “Nossa esperança é que surjam reações ao decreto que o presidente assinou e não leu. Que fique de molho e não passe de carta de intenções”, afirma. “Em terceira versão requentada, carece de melhor parecer jurídico, em conformidade com a Constituição Federal”, completa.

Mas o conteúdo do programa também conta com apoiadores que organizam, para este domingo (7), um “beijaço” na capital paulista para pedir que o governo mantenha o texto original. O local já está marcado: esquina da avenida Paulista com a rua Augusta, às 17h. “Setores da sociedade brasileira que habitualmente escondem seu conservadorismo em uma retórica politicamente correta foram finalmente evidenciados por seu caráter retrógrado, antilibertário e preconceituoso”, diz o manifesto pró-plano.

O UOL Notícias entrou em contato com a Presidência da República. A assessoria de imprensa informou que o governo não se pronuncia sobre o assunto.

O polêmico plano

Aprovado em dezembro, o PNDH-3 traça recomendações ao Legislativo para a futura elaboração de leis orientadas a casos que envolvam os direitos humanos no país. Um dos pontos mais controversos prevê a criação de uma Comissão da Verdade, para investigar casos de violação de direitos humanos durante a ditadura militar.

A medida gerou desentendimentos entre militares e a pasta de direitos humanos, e culminou em uma alteração no plano, assinada por Lula no último dia 14, suprimindo a expressão "repressão política", para englobar qualquer conflito no período.

A mudança não encerrou a discussão, já que outras polêmicas foram mantidas, como a tentativa de controle da imprensa e a não repreensão às invasões de terra, alvos de críticas de entidades como a Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Confederação Nacional da Agricultura (CNA).

Em nota, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, que elaborou o programa, diz que ele incorpora propostas aprovadas em cerca de 50 conferências nacionais, realizadas desde 2003, e que sua versão preliminar esteve disponível durante 2009 para sugestões e críticas.


Fonte:
Rosanne D'Agostino
Do UOL Notícias
Em São Paulo
Mais informação acesse uol.com.br

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