Cada ano tem sua agenda própria de debates. É nesta agenda que o país se faz e se reconhece. Escolhe seus caminhos, delineia seu futuro.
O ano que agora finda foi marcado por um debate importante: o das células tronco. Ou seja, o debate sobre o começo da vida.
Em que momento a vida é definida enquanto vida, e portanto passa a ser um direito do cidadão a ser protegido constitucionalmente?
Esse debate de conotações jurídicas, religiosas, científicas e econômicas se concretizou na questão sobre a permissão ou proibição de pesquisas com células tronco.
O ator principal do debate foi o Supremo Tribunal Federal, que deu a palavra final. Permitiu a pesquisa.
Alguns protestaram dizendo que o Supremo tinha se investido de super poderes, excessivos, capazes até de determinar o início da vida.
Nada disso. Apenas admitiu, em nome da preservação e do futuro da vida, a pesquisa científica com as células tronco. Foi uma opção de pragmática social, e não uma afirmação filosófica ou um ato religioso. Com isso o Supremo se aliou ao progresso e ao futuro.
O ano que se inicia pode vir a ser marcado por outro debate igualmente polêmico. E, no caso, um debate contrário. Em vez de quando começa a vida, quando começa a morte?
E o ator principal não será o Supremo, pelo menos por enquanto. Será o Congresso Nacional.
É o debate sobre a ortotanásias. Conforme explica Carlos Vital Lima na Folha de São Paulo da semana passada, “o processo de ortontanásia significa morte no momento certo, nem apressada como no caso da eutanásia, nem prolongada como no caso da distanásia.”
Correm no Congresso projetos de leis antagônicos. De um lado, o projeto do deputado Talmir Rodrigues que diz “É proibida a suspensão de cuidados de pacientes que apresentarem quadros de Estado Vegetativo Persistente”, sem inclusive nenhuma função cognitiva.
De outro, o projeto do senador Gérson Camata que diz não constituir mais crime “deixar de fazer uso de meios desproporcionais e extraordinários, em situação de morte iminente e inevitável”, com o consentimento do paciente ou de sua família.
Eis aí o campo da batalha, o debate da agenda.
Pode o médico deixar o paciente morrer quando com seu consentimento ou de seus responsáveis, e diante da irreversibilidade da situação, assim lhe for determinado? Ou ele terá que obrigatoriamente usar de todos os meios científicos e tecnológicos disponíveis para manter o paciente vivo?
Esse é o drama vivido por milhares de famílias no Brasil e no mundo todo.
A medicina é capaz de prolongar a vida, hoje, de uma maneira que muitos julgam artificial, impondo ao paciente e seus familiares um sofrimento imenso, tortura mesmo.
Já ouvi de doentes com câncer terminal, meses de hospital, todos os tubos e eletros possíveis, todas as cirurgias invasivas, todos os remédios de efeitos colaterais deprimentes, com dor sequencial e acumulativa; ouvi deles o pedido de "eu quero morrer". Ou o pedido de "me livre desta humilhação."
Pois nos intervalos de lucidez das agonias inevitáveis e irreversíveis, o paciente se sente humilhado e impotente diante do confronto entre a insistência tecnológica e a desesperança moral.
Na elaboração da Constituição de 1988, enquanto funcionava a Comissão Afonso Arinos, o professor Hilton Rocha, oftalmologista emérito, quis inserir um artigo que dizia: diante da falta de órgãos para transplante, inclusive os de córneas, o corpo do cidadão pertence ao Estado. Para este fim específico: transplante de órgãos para salvar vidas.
Cândido Mendes, Cristóvão Buarque e Antônio Ermírio, entre outros, foram contra. Argumentaram que há limites para a intervenção do Estado mesmo socialmente fundamentada.
Estamos diante outra vez desta questão: quais os limites para a ação do Estado?
Do ponto de vista jurídico clássico, que nesse caso muito se confunde com as opções religiosas e as estruturas de personalidade de cada um, a questão é sobre o que deve prevalecer para o apressar ou o adiar a morte.
Ou a vontade do Estado, legalizando e criminalizando a conduta, ou a conduta b.
A conduta b: o Estado nada tem a ver com a situação. Deve prevalecer a autonomia da vontade privada, a vontade do cidadão, representada por ele ou por seus responsáveis, e medicamente fundamentada.
Assim, por exemplo, sugere o artigo 3° do Projeto de Lei 3002/08: “É permitida ao médico assistente a prática da ortotanásia mediante solicitação expressa e por escrito do doente ou seu representante legal.”
Retomo a pergunta: cabe ao Estado ou ao paciente dispor de sua morte?
O ano que agora finda foi marcado por um debate importante: o das células tronco. Ou seja, o debate sobre o começo da vida.
Em que momento a vida é definida enquanto vida, e portanto passa a ser um direito do cidadão a ser protegido constitucionalmente?
Esse debate de conotações jurídicas, religiosas, científicas e econômicas se concretizou na questão sobre a permissão ou proibição de pesquisas com células tronco.
O ator principal do debate foi o Supremo Tribunal Federal, que deu a palavra final. Permitiu a pesquisa.
Alguns protestaram dizendo que o Supremo tinha se investido de super poderes, excessivos, capazes até de determinar o início da vida.
Nada disso. Apenas admitiu, em nome da preservação e do futuro da vida, a pesquisa científica com as células tronco. Foi uma opção de pragmática social, e não uma afirmação filosófica ou um ato religioso. Com isso o Supremo se aliou ao progresso e ao futuro.
O ano que se inicia pode vir a ser marcado por outro debate igualmente polêmico. E, no caso, um debate contrário. Em vez de quando começa a vida, quando começa a morte?
E o ator principal não será o Supremo, pelo menos por enquanto. Será o Congresso Nacional.
É o debate sobre a ortotanásias. Conforme explica Carlos Vital Lima na Folha de São Paulo da semana passada, “o processo de ortontanásia significa morte no momento certo, nem apressada como no caso da eutanásia, nem prolongada como no caso da distanásia.”
Correm no Congresso projetos de leis antagônicos. De um lado, o projeto do deputado Talmir Rodrigues que diz “É proibida a suspensão de cuidados de pacientes que apresentarem quadros de Estado Vegetativo Persistente”, sem inclusive nenhuma função cognitiva.
De outro, o projeto do senador Gérson Camata que diz não constituir mais crime “deixar de fazer uso de meios desproporcionais e extraordinários, em situação de morte iminente e inevitável”, com o consentimento do paciente ou de sua família.
Eis aí o campo da batalha, o debate da agenda.
Pode o médico deixar o paciente morrer quando com seu consentimento ou de seus responsáveis, e diante da irreversibilidade da situação, assim lhe for determinado? Ou ele terá que obrigatoriamente usar de todos os meios científicos e tecnológicos disponíveis para manter o paciente vivo?
Esse é o drama vivido por milhares de famílias no Brasil e no mundo todo.
A medicina é capaz de prolongar a vida, hoje, de uma maneira que muitos julgam artificial, impondo ao paciente e seus familiares um sofrimento imenso, tortura mesmo.
Já ouvi de doentes com câncer terminal, meses de hospital, todos os tubos e eletros possíveis, todas as cirurgias invasivas, todos os remédios de efeitos colaterais deprimentes, com dor sequencial e acumulativa; ouvi deles o pedido de "eu quero morrer". Ou o pedido de "me livre desta humilhação."
Pois nos intervalos de lucidez das agonias inevitáveis e irreversíveis, o paciente se sente humilhado e impotente diante do confronto entre a insistência tecnológica e a desesperança moral.
Na elaboração da Constituição de 1988, enquanto funcionava a Comissão Afonso Arinos, o professor Hilton Rocha, oftalmologista emérito, quis inserir um artigo que dizia: diante da falta de órgãos para transplante, inclusive os de córneas, o corpo do cidadão pertence ao Estado. Para este fim específico: transplante de órgãos para salvar vidas.
Cândido Mendes, Cristóvão Buarque e Antônio Ermírio, entre outros, foram contra. Argumentaram que há limites para a intervenção do Estado mesmo socialmente fundamentada.
Estamos diante outra vez desta questão: quais os limites para a ação do Estado?
Do ponto de vista jurídico clássico, que nesse caso muito se confunde com as opções religiosas e as estruturas de personalidade de cada um, a questão é sobre o que deve prevalecer para o apressar ou o adiar a morte.
Ou a vontade do Estado, legalizando e criminalizando a conduta, ou a conduta b.
A conduta b: o Estado nada tem a ver com a situação. Deve prevalecer a autonomia da vontade privada, a vontade do cidadão, representada por ele ou por seus responsáveis, e medicamente fundamentada.
Assim, por exemplo, sugere o artigo 3° do Projeto de Lei 3002/08: “É permitida ao médico assistente a prática da ortotanásia mediante solicitação expressa e por escrito do doente ou seu representante legal.”
Retomo a pergunta: cabe ao Estado ou ao paciente dispor de sua morte?
Joaquim Falcão
Fonte: Blog do Ricado Noblat
Nenhum comentário:
Postar um comentário