quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Os Meus Sonhos São Mais Belos que a Conversa Alheia

Não faço visitas, nem ando em sociedade alguma - nem de salas, nem de cafés. Fazê-lo seria sacrificar a minha unidade interior, entregar-me a conversas inúteis, furtar tempo senão aos meus raciocínios e aos meus projetos, pelo menos aos meus sonhos, que sempre são mais belos que a conversa alheia. 

Devo-me a humanidade futura. Quanto me desperdiçar desperdiço do divino patrimônio possível dos homens de amanhã; diminuo-lhes a felicidade que lhes posso dar e diminuo-me a mim-próprio, não só aos meus olhos reais, mas aos olhos possíveis de Deus. 

Isto pode não ser assim, mas sinto que é meu dever crê-lo.

Fernando Pessoa, 'Inéditos'

Só o presente é verdadeiro e real

Um ponto importante da sabedoria de vida consiste na proporção correta com a qual dedicamos a nossa atenção em parte ao presente, em parte ao futuro, para que um não estrague o outro. Muitos vivem em demasia no presente: são os levianos; outros vivem em demasia no futuro: são os medrosos e os preocupados. É raro alguém manter com exatidão a justa medida. Aqueles que, por intermédio de esforços e esperanças, vivem apenas no futuro e olham sempre para a frente, indo impacientes ao encontro das coisas que hão-de vir, como se estas fossem portadoras da felicidade verdadeira, deixando entrementes de observar e desfrutar o presente, são, apesar dos seus ares petulantes, comparáveis àqueles asnos da Itália, cujos passos são apressados por um feixe de feno que, preso por um bastão, pende diante da sua cabeça. Desse modo, os asnos vêem sempre o feixe de feno bem próximo, diante de si, e esperam sempre alcançá-lo. 

Tais indivíduos enganam-se a si mesmos em relação a toda a sua existência, na medida em que vivem ad ínterim [interinamente], até morrer. Portanto, em vez de estarmos sempre e exclusivamente ocupados com planos e cuidados para o futuro, ou de nos entregarmos à nostalgia do passado, nunca nos deveríamos esquecer de que só o presente é real e certo; o futuro, ao contrário, apresenta-se quase sempre diverso daquilo que pensávamos. 

O passado também era diferente, de modo que, no todo, ambos têm menor importância do que parecem. Pois a distância, que diminui os objetos para o olho, engrandece-os para o pensamento. Só o presente é verdadeiro e real; ele é o tempo realmente preenchido e é nele que repousa exclusivamente a nossa existência. Dessa forma, deveríamos sempre dedicar-lhe uma acolhida jovial e fruir com consciência cada hora suportável e livre de contrariedades ou dores, ou seja, não a turvar com feições carrancudas acerca de esperanças malogradas no passado ou com ansiedades pelo futuro. Pois é inteiramente insensato repelir uma boa hora presente, ou estragá-la de propósito, por conta de desgostos do passado ou ansiedades em relação ao porvir.

Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'
O pensamento humano pouco evoluiu apesar dos séculos. O homem contemporâneo vive cercado de evoluções tecnológicas que os torna segregado, incapaz de compreender a força de transformar os seus dias e sua exposição em sonhos.

Nosso horizonte é sombrio.

Teófilo Júnior

Decisão histórica: STF decide soltar mulheres grávidas presas ou com filhos menores de 12 anos

Por 4 votos a 1, os ministros da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram conceder habeas corpus coletivo para converter a prisão preventiva de todas as mães de crianças até 12 anos e todas as grávidas em prisão domiciliar, em julgamento histórico, nesta terça-feira (20). A decisão deve tirar dos presídios milhares de mulheres que aguardam julgamento.

A decisão vale somente para detentas que aguardam julgamento e não tenham cometido crimes com uso de violência ou grave ameaça, e também vai depender da análise da dependência da criança dos cuidados da mãe. Cerca de 4 mil mulheres devem ser beneficiadas.

A decisão foi tomada a partir de um habeas corpus protocolado por um grupo de advogados militantes na área de direitos humanos, com apoio da Defensoria Pública da União (DPU). A medida vale para presas que estão em uma lista do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e que foi remetida ao Supremo pela DPU.

A coordenadora de Gênero, Etnia e Geracional da Fenajud, Ana Paula Araújo, acredita que “a decisão é considerada pela Fenajud  uma boa medida que irá contribuir para humanizar o sistema prisional; bem como, trará um novo olhar para as crianças filhas de mães detentas. Será de grande ajuda na ressocialização das presas e na proteção à criança”.

Notificações

De acordo com a decisão, os tribunais de Justiça do país serão notificados sobre a decisão e deverão cumprir a decisão em 30 dias. Os parâmetros também deverão ser observados nas audiências de custódia.

Fonte: Fenajud

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Parábola. O Sapo!

Se você puser um sapo numa panela, 
enchê-la com água e a colocar no fogo, 
vai perceber uma coisa interessante: 
O sapo se ajusta à temperatura da água, 
e permanece lá dentro. 
E continuaria se ajustando, 
quanto mais subisse a temperatura. 
Quando a água estivesse perto do ponto de fervura,
 e o sapo tentasse saltar para fora,
 não conseguiria, 
porque estaria muito cansado devido aos ajustes que teve que fazer. 
Alguns diriam que o que matou o sapo foi a água fervendo...
O que o matou, na verdade, 
foi a sua incapacidade de decidir quando pular fora.
 Pare de se ajustar à pessoas erradas, 
relacionamentos abusivos,
 amizades parasíticas,
 trabalhos fim-de-carreira 
e tantas situações que vivem te "esquentando".
 Quando você já fez tudo o que pôde, 
e ainda tem que viver fazendo mais, 
você corre o risco de morrer tentando, 
e não alcançar nada.
Saia fora disso.

Como estrelas na Terra






O filme que todo educador deveria assistir!
Escritor: não somente uma certa maneira especial de ver as coisas, senão também uma impossibilidade de as ver de qualquer outra maneira.

Carlos Drummond de Andrade

Barriga é barriga

Barriga é barriga, peito é peito e tudo mais. 

Confesso que tive agradável surpresa ao ver Chico Anísio no programa do Jô, dizendo que o exercício físico é o primeiro passo para a morte. 

Depois de chamar a atenção para o fato de que raramente se conhece um atleta que tenha chegado aos 80 anos e citar personalidades longevas que nunca fizeram ginástica ou exercício - entre elas o jurista e jornalista Barbosa Lima Sobrinho - mas chegou à idade centenária, o humorista arrematou com um exemplo da fauna, a tartaruga com toda aquela lerdeza, vive 300 anos. Você conhece algum coelho que tenha vivido15 anos? 

Gostaria de contribuir com outro exemplo, o de Dorival Caymmi. O letrista, compositor e intérprete baiano é conhecido como pai da preguiça. Passa 4/5 do dia deitado numa rede, bebendo, fumando e mastigando. Autêntico marcha-lenta, leva 10 segundos para percorrer um espaço de três metros. 

Pois mesmo assim e sem jamais ter feito exercício físico, completou 90 anos e nada indica que vá morrer tão cedo. 

Conclusão: Esteira, caminhada, aeróbica, musculação, academia? Sai dessa enquanto você ainda tem saúde! E viva o sedentarismo ocioso!

Não fique chateado se você passar a vida inteira gordo.Você terá toda eternidade para ser só osso!!! Então: NÃO FAÇA MAIS DIETA!! Afinal, a baleia bebe só água, só come peixe, faz natação o dia inteiro, e é GORDA!!! VIVA A BATATA FRITA E O CHOPP!

Você tem pneus? Lógico, todo avião tem!

Celso Sanches

Imagem


segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018




Definhamento

“Thinning” (“definhamento”) é o termo usado pelo crítico John Clute para exprimir o que ele considera um conceito essencial de grande parte da literatura de Fantasia. 

Para Clute (numa argumentação muito mais esmiuçada e cheia de fractais do que sou capaz de reproduzir aqui) a estrutura da história de fantasia básica é a existência de um estado inicial de equilíbrio, depois uma crise que pode ser de definhamento ou de outra vicissitude, e por fim uma arrancada final e uma redenção, mesmo que a um preço alto. 

No caso do horror, é um definhamento sem ruptura, uma queda sem volta nas mãos de forças que podem tudo. O horror é uma fantasia sem luz no fim do túnel.
Na Encyclopedia of Fantasy, Clute diz que muitas fantasias são “fábulas de recuperação”, ou de “restauração”.  O definhamento surge naquelas histórias dos reinos onde não chove mais, onde a rainha não pode ter filhos, onde o rei perdeu a força e a razão, onde algo precioso foi tomado de forma brutal, onde uma maldição recente ou milenar faz a terra regredir a diferentes tipos de entropia, etc.  

A entropia aqui é por minha conta, porque nada impede que uma história de fantasia também ilustre um processo científicamente explicável; não deixa de ser fantasia por isto.  Muitas histórias de fantasia mostram um reino enfraquecido à espera da chegada (ou do retorno) de um herói, ou de um visitante de fora que traga um sopro de energia a um povo que perdeu a vitalidade.
O definhamento não pode ser devido apenas a derrotas militares ou confrontos mal sucedidos com potestades cósmicas.  Pode ser o envelhecimento natural de uma terra, de um povo, que começa a se ver cada vez menos no mundo que criou. A perda dos poderes mágicos de uma civilização pagã, que lentamente dá lugar a uma visão-do-mundo dominante. Os gregos, os romanos, os árabes, a Europa ocidental, todos tiveram seu momento. 

Clute cita como exemplos de “thinning” a exaustão final dos poços de magia em The Farthest Shore de Ursula LeGuin (1972) e o retorno de Frodo a um Condado que não é mais o mesmo no final de O Senhor dos Anéis. (Aqui o verbete sobre “Thinning”: http://tinyurl.com/pq78ukq).
Nem toda fantasia tem que apresentar alguma forma de definhamento, imagino eu, é apenas algo muito típico, tal como a “jornada do herói” tão citada pelos roteiristas.  É uma história possível e uma estrutura mítica profunda. Elementos dramatúrgicos que correspondem a algum modo de sentir ou de devanear que não tem lugar nem época. Podem não ser ingredientes “sine qua non”, mas aparecem com tal frequência e peso que somos obrigados a levá-los em conta quando tentamos entender o espírito do gênero.

Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo

domingo, 25 de fevereiro de 2018

Noé, de Pedro Tamen

Pronto, pronto, eu faço. Dá um trabalhão
mas faço. Corto madeira, arranjo pregos,
gasto o martelo. E o pior também:
correr o mundo a recolher os bichos,
coisas de nada como formigas magras,
e os outros, os grandes, os que mordem
e rugem. E sei lá quanto são!
Em que assados me pões. Tu
gastaste seis dias, e eu nunca mais cabo.
Andar por esse mundo, a pé enxuto ainda,
a escolher os melhores, os de melhor saúde,
que o mundo que tu queres não há-de nascer torto.
Um por um, e por uma, é claro, é aos pares
— o espaço que isso ocupa.


Mas não é ser carpinteiro,
não é ser caminheiro,
não é ser marinheiro o que mais me inquieta.
Nem é poder esquecer
a pulga, o ornitorrinco.
O que mais me inquieta, Senhor,
é não ter a certeza,
ou mais ter a certeza de não valer a pena,
é partir já vencido para outro mundo igual.

Soneto do Amor Como um Rio

Este infinito amor de um ano faz
Que é maior do que o tempo e do que tudo
Este amor que é real, e que, contudo
Eu já não cria que existisse mais.

Este amor que surgiu insuspeitado
E que dentro do drama fez-se em paz
Este amor que é o túmulo onde jaz
Meu corpo para sempre sepultado.

Este amor meu é como um rio; um rio
Noturno, interminável e tardio
A deslizar macio pelo ermo...

E que em seu curso sideral me leva
Iluminado de paixão na treva
Para o espaço sem fim de um mar sem termo.


Mário Quintana

O grande prêmio

Chegou à hora do grande sorteio do maior prêmio de todos os tempos da Mega-Sena. Um balconista de quarenta e quatro anos, de uma cidade do interior, ganhou O prêmio.

Dias depois, ao retirar seu prêmio, Paulo descobre que a loteria está oferecendo no lugar de milhões um determinado traço de caráter chamado "perseverança", já prontinho. Durante dois dias consecutivos, ele se torna o centro das atenções. Depois volta à loja onde trabalha, e cai completamente no esquecimento.

Dez anos depois, a mesma equipe vai entrevistar Paulo, para saber como é que ele tem vivido: desde que ganhei o prêmio da perseverança, mantive-me no emprego durante dez anos, dei o melhor de mim mesmo, onde quer que me colocassem. Fui promovido diversas vezes. Hoje sou subgerente. Concluí o segundo grau estudando à noite durante dois anos. Jamais teria conseguido isso antes, pois eu desistiria na segunda aula. Mas me mantive firme e por isso, me orgulho do diploma.

Olhando para trás, percebo que um cheque de milhões teria me habilitado a desistir de tudo. Provavelmente, teria destruído minha dignidade, meu casamento, talvez até mesmo a minha vida. Contudo essa qualidade chamada perseverança tornou-me um homem feliz e bem-sucedido.

Prof. Menegatti
Incapaz de dominar suas mais mesquinhas paixões,
 sem controle do próprio egoísmo, tolo, 
tonto, sofrido, inseguro e criminoso, 
o homem lança suas derradeiras ambições para a posteridade, 
quando será imantado numa glória a que não assistirá,
 mitificado naquilo que nunca foi. 
E sua ânsia de nobreza é colocada em ser esplêndido em cinzas,
 faustoso em túmulos, 
solenizando a morte com incrível esplendor,
 transformando em cerimônia e pompa toda a estupidez de sua natureza.
 
Millôr Fernandes 

Despedida

Existem duas dores de amor:
A primeira é quando a relação termina e a gente,
seguindo amando,
 tem que se acostumar com a ausência do outro,
com a sensação de perda, 
de rejeição e com a falta de perspectiva,
já que ainda estamos tão embrulhados na dor
que não conseguimos ver luz no fim do túnel.
A segunda dor é quando começamos a vislumbrar 
a luz no fim do túnel.
 
Martha Medeiros 

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Sempre perto do poder

Político que se preza não perde procissão. Na Paraíba, o deputado Antônio Montenegro, obediente à regra, esteve certa vez na procissão de Santo Antônio, em Piancó. Aproximou-se para ajudar a carregar o andor, mas os quatro lugares já estavam ocupados, um deles pelo senador Rui Carneiro, do MDB. Montenegro puxou o padre num canto e apelou:
- Reverendo, eu queria pelo menos que o senhor deixasse eu ir perto da banda de música. Longe do poder é que não posso ficar...
 
Diário do Poder 

Aquele que mantém a calma diante de todas as adversidades da vida mostra simplesmente ter conhecimento de quão imensos e múltiplos são os seus possíveis males, motivo pelo qual ele considera o mal presente uma parte muito pequena daquilo que lhe poderia advir: e, inversamente, quem sabe desse fato e reflete sobre ele nunca perderá a calma.

Arthur Schopenhauer, in "A Arte de Ser Feliz"

Humor

Reações do álcool

Na aula de química o professor pergunta:
- Quais as principais reações do álcool?
O aluno responde:
- Chorar pela ex, achar que esta rico, ficar valente e pegar mulher feia ...
Professor:
- Tirou 10!



Versículos do dia

Ele rega os montes desde as suas câmaras; a terra farta-se do fruto das suas obras. Salmos 104:13
Porque toda a criatura de Deus é boa, e não há nada que rejeitar, sendo recebido com ações de graças. 1 Timóteo 4:4
No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...

Mario Quintana

De que adianta falar quatro idiomas e não dizer “bom dia” no elevador?

Competitividade sem educação está nos transformando em perigosas bestas. “Sai da frente ou eu atropelo” é o recado.

Em algum momento da vida, o mundo resolveu entender “competitividade” como alguma coisa parecida com o ditado antigo que diz “farinha pouca, meu pirão primeiro”. Que pena.

Eu tenho a impressão de que esse engano é um dos grandes causadores da miséria em que nos enfiamos.

No meio desse equívoco, ser competitivo significa viver contra o outro, querer tudo e querer antes de todo mundo. Por aí, um batalhão competitivo espera sedento sua vez de partir para cima, de agarrar a chance com unhas e dentes, de provar seu valor, de fazer e acontecer. E tudo isso significa “passar por cima” de quem estiver na frente.

Em treinamentos e palestras, gurus de auto-ajuda repetem “você é especial porque foi o único espermatozoide a atingir o óvulo de sua mãe” e outras bobagens. Mas quase ninguém diz o essencial: “educação, respeito, ética e honestidade deixam o mundo melhor.”

Sem esses valores, ser competitivo é uma desgraça! O sujeito competitivo e mal-educado, desrespeitoso, antiético e desonesto é um monstro. Ponto! Não tem escrúpulos nem limites. Faz qualquer coisa em nome de suas metas.

Verdade é que competitividade sem educação está nos transformando em perigosas bestas. “Sai da frente ou eu atropelo” é o recado.

Nessa disputa estrábica, a gente aprende a falar inglês, alemão, espanhol, mandarim mas esquece como dizer “bom dia” no elevador!

“Fulano é poliglota!”, sabe pressionar, mentir, ofender e chantagear em quatro ou cinco idiomas! De que adianta?

Empatia, simpatia, fraternidade e outras joias são consideradas lixo entre os mal competitivos. Porque “abrem a guarda”. Ser gentil é mostrar fragilidade. O competidor matador fecha a cara e atropela. Aqui entre nós, tão ruim quanto os maus perdedores é o péssimo ganhador!

Dia desses, na festinha de aniversário do meu filho num bufê infantil, as moças que organizam a recreação fizeram lá pelas tantas a velha brincadeira da “dança das cadeiras” com as crianças. Na rodada final, disputando o último assento, restaram um menino e uma menina. Tal como um gladiador, para ganhar a peleja o garoto de nove anos empurrou a menina com tanta força que a machucou. A menina saiu chorando, os joelhos esfolados, e o menino foi festejado pelos amigos.

É triste mas é a verdade. A sanha de vencer a qualquer preço nos transforma, em qualquer idade, em perfeitos panacas. Cheios de motivação e energia, talhados em regras e chavões neurolinguísticos batidos mas tão esquecidos do óbvio: mais importante que ser melhor do que o outro é tratar o outro melhor.


Por
Fonte aqui

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018


O fotógrafo Clark Little é especialista em fotografar ondas, essa foto foi obtida no Havaí poucos segundos antes do impacto
"Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade !


Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo ! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade !
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita !"


Florbela Espanca

A avó, a cidade e o semáforo

Quando ouviu dizer que eu ia à cidade, Vovó Ndzima emitiu as maiores suspeitas:

– E vai ficar em casa de quem?

– Fico no hotel, avó.

– Hotel? Mas é casa de quem?

Explicar, como? Ainda assim, ensaiei: de ninguém, ora. A velha fermentou nova desconfiança: uma casa de ninguém?

– Ou melhor, avó: é de quem paga – palavreei, para a tranquilizar.

Porém, só agravei – um lugar de quem paga? E que espíritos guardam uma casa como essa?

A mim me tinha cabido um prémio do Ministério. Eu tinha sido o melhor professor rural. E o prémio era visitar a grande cidade. Quando, em casa, anunciei a boa nova, a minha mais-velha não se impressionou com meu orgulho. E franziu a voz:

– E, lá, quem lhe faz o prato?

– Um cozinheiro, avó.

– Como se chama esse cozinheiro?Ri, sem palavra. Mas, para ela, não havia riso, nem motivo. 
Cozinhar é o mais privado e arriscado ato. No alimento se coloca ternura ou ódio. Na panela se verte tempero ou veneno. Quem assegurava a pureza da peneira e do pilão? Como podia eu deixar essa tarefa, tão íntima, ficar em mão anônima? Nem pensar, nunca tal se viu, sujeitar-se a um cozinhador de que nem o rosto se conhece.– Cozinhar não é serviço, meu neto – disse ela. – Cozinhar é um modo de amar os outros.Ainda tentei desviar-me, ganhar uma distracção. Mas as perguntas se somavam, sem fim.
– Lã, aquela gente tira água do poço?
– Ora, avô…

– Quero saber é se tiram todos do mesmo poço…

Poço, fogueira, esteira: o assunto pedia muita explicação. E divaguei, longo e lento. Que aquilo, lá, tudo era de outro fazer. Mas ela não arredou coração. Não ter família, lá na cidade, era coisa que não lhe cabia. A pessoa viaja é para ser esperado, do outro lado a mão de gente que é nossa, com nome e história. Como um laço que pede as duas pontas. Agora, eu dirigir-me para lugar incógnito onde se deslavavam os nomes! Para a avó, um país estrangeiro começa onde já não reconhecemos parente.

– Vai deitar em cama que uma qualquer lençolou?

Na aldeia era simples: todos dormiam despidos, enrolados numa capulana ou numa manta conforme os climas. Mas lá, na cidade, o dormente vai para o sono todo vestido. E isso minha avó achava de mais. Não é nus que somos vulneráveis. Vestidos é que somos visitados pelas valoyi e ficamos à disposição dos seus intentos. Foi quando ela pediu. Eu que levasse uma moça da aldeia para me arrumar os preceitos do viver.

– Avó, nenhuma moça não existe.

Dia seguinte, penetrei na penumbra da cozinha, preparado para breve e sumária despedida, quando deparei com ela, bem sentada no meio do terreiro. Parecia estar entronada, a cadeira bem no centro do universo. Mostrou-me uns papéis.

– São os bilhetes.

– Que bilhetes?

– Eu vou consigo, meu neto.

Foi assim que me vi, acabrunhado, no velho autocarro. Engolíamos poeiras enquanto os alto-falantes espalhavam um roufenho ximandjemandje. A avó Ndzima, gordíssima, esparramada no assento, ia dormindo. No colo enorme, a avó transportava a cangarra com galinhas vivas. Antes de partir, ainda a tentara demover: ao menos fossem pouquitas as aves de criação.

– Poucas como? Se você mesmo disse que lá não semeiam capoeiras.

Quando entrámos no hotel, a gerência não autorizou aquela invasão avícola. Todavia, a avó falou tanto e tão alto que lhe abriram alas pelos corredores. Depois de instalados, Ndzima desceu à cozinha. Não me quis como companhia. Demorou tempo de mais. Não poderia estar apenas a entregar os galináceos. Por fim, lá saiu. Vinha de sorriso:

– Pronto, já confirmei sobre o cozinheiro…

– Confirmou o quê, avó?

– Ele é da nossa terra, não há problema. Só falta conhecer quem faz a sua cama.

Aconteceu, depois. Chegado do Ministério, dei pela ausência da avó. Não estava no quarto, nem no hotel. Me urgenciei, aflito, pelas ruas no encalço dela. E deparei com o que viria a repetir-se todas tardes, a vovó Ndzima entre os mendigos, na esquina dos semáforos. Um aperto me minguou o coração: pedinte, a nossa mais-velha?! As luzes do semáforo me chicoteavam o rosto:

– Venha para casa, avó!

– Casa?!

– Para o hotel. Venha.

Passou-se o tempo. Por fim, chegou o dia do regresso à nossa aldeia. Fui ao quarto da vovó para lhe oferecer ajuda para os carregos. Tombou-me o peito ao assomar à porta: ela estava derramada no chão, onde sempre dormira, as tralhas espalhadas sem nenhum propósito de serem embaladas.

– Ainda não fez as malas, avó?

– Vou ficar, meu neto.

O silêncio me atropelou, um riso parvo pincelando-me o rosto.

– Vai ficar, como?

– Não se preocupe. Eu já conheço os cantos disto aqui.

– Vai ficar sozinha?

– Lá, na aldeia, ainda estou mais sozinha.

A sua certeza era tanta que o meu argumento murchou. O autocarro demorou a sair. Quando passámos pela esquina dos semáforos, não tive coragem de olhar para trás.

O Verão passou e as chuvadas já não espreitavam os céus quando recebi encomenda de Ndzima. 

Abri, sôfrego, o envelope. E entre os meus dedos uns dinheiros, velhos e encarquilhados, tombaram no chão da escola. Um bilhete, que ela ditara para que alguém escrevesse, explicava: a avó me pagava uma passagem para que eu a visitasse na cidade. Senti luzes me acendendo o rosto ao ler as últimas linhas da carta: “… agora, neto, durmo aqui perto do semáforo. Faz-me bem aquelas luzinhas, amarelas, vermelhas. Quando fecho os olhos até parece que escuto a fogueira, crepitando em nosso velho quintal…”.

Mia Couto, conto ‘A avó, a cidade e o semáforo’, em “O Fio das Missangas”. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Pescaria

Rio Piranhas - Sitio São João

A dor e a delícia

Algum tempo atrás falei aqui que escrevo esta coluna “com um pé nas costas”, e que ela não me exige nenhum esforço mental. Gostaria de corrigir esta leviandade, se ainda der tempo. Na verdade eu devia estar me referindo ao próprio texto que eu escrevia naquele momento, feito provavelmente enquanto eu bebericava um café e esperava um telefonema. 

Nem tudo é assim tão fácil. Já houve muitos casos em que comecei a escrever sobre um determinado assunto, percebi que não estava tão bem informado sobre o tema como imaginara, e fiquei das duas da tarde às dez da noite lendo alguns livros a respeito. Depois, escrevi o artigo em uma hora, e mandei.

Alguém irá me cochichar que a relação custo-benefício desse trabalho é meio deficitária, mas este linguajar de economês me lembra uma história de meus tempos de estudante. Meu guru João Antonio de Paula, que dirigia o cineclube de escola de Economia, comentou certa vez: 

“Rapaz... Marx era fogo. Ele só falava de um assunto se ele entendesse mesmo. Se ele queria escrever um artigo sobre operários de usina siderúrgica, ele ia no Museu Britânico e lia todos os livros sobre siderurgia que tivesse lá.” 

Por alguma razão misteriosa, esta informação incrustou-se em meu cérebro como um Projeto de Vida, um Estatuto de Conduta. Eu senti naquele exato instante, numa fria tarde belorizontina de 1971, que a vida humana só fazia sentido se um sujeito se comportasse exatamente daquela forma. E continuo achando, embora esta certeza esteja hoje temperada pelo bom senso.

Escrever é pensar em voz alta, é improvisar, mesmo quando a gente pesquisa até cair de sono. Nunca sabemos se dez horas de estudo nos renderão uma ideia sequer que se aproveite. O resultado às vezes é inversamente proporcional ao esforço, mas isto não é pretexto para que a gente se esforce menos. 

As boas ideias sempre nos dão a impressão de terem caído do céu. Dizia um poeta francês: “On ne cherche pas, on trouve”. A gente não procura: acha. (Fui dar uma peruada no Google: a frase é atribuída a Picasso, mas eu pensava que o autor era Alfred de Musset, Alfred de Vigny, um desses caras.)

Todo trabalho envolve a dor de ficar procurando em vão e a delícia de ver uma ideia genial cair do céu no colo da gente. Mas mesmo quando a ideia cai do céu o sujeito ainda tem trabalho. É preciso levantar da poltrona, pegar o caderno, pegar a caneta, e ficar prendendo a ideia no papel para que ela não saia voando pela janela e vá pousar no juízo de alguém mais disposto. 

Sabem por que os grandes cantadores de viola improvisam aqueles versos tão geniais? Porque improvisam o tempo todo. Quando você vir um cantador calado, o olhar perdido no teto, ou paradão no ponto de ônibus, ou fumando um cigarro no terraço, pode ter certeza de que ele está fazendo sextilhas, está glosando motes que ele mesmo inventa, está produzindo pepitas de ouro e jogando-as de volta ao rio, para procurar por elas quando alguém um dia lhe pedir uma.

Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo 

Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.

Clarice Lispector

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018


Virás, hoje?

Desejaria estender tapetes de púrpura
E desejaria, em toda a região
Encher de bálsamo extraído de pichéis de ouro
As lâmpadas das flores até acima.

E que todas ardessem o tempo suficiente
Para que, cegos pelo dia vermelho,
Nos reconhecêssemos na noite pálida
E a nossa alma se transformasse em estrela.

Ó generosa, tu dás sonhos às minhas noites, cânticos às minhas manhãs, objectivos aos meus dias e desejos solares aos meus crepúsculos vermelhos. Tu dás sem fim. E eu ajoelho-me e estendo os braços para receber a tua graça. Ó generosa! Sou tudo aquilo que queres. E serei escravo ou rei conforme ralhes ou sorrias. Mas és tu que me fazes ser.

Isto, dir-to-ei muitas vezes, muitas vezes. A minha confissão amadurecerá, cada vez mais simples e nua. E o dia em que tiver conseguido torná-la perfeitamente simples e em que a compreendas perfeitamente, será o primeiro dia do nosso Verão. Que durará mesmo para além dos dias do teu René.

Virás, hoje?

Rainer Maria Rilke, in 'Carta a Lou Andreas-Salomé, 10 de Junho de 1897'

*Mantida a grafia original
Pensamentos valem e vivem pela observação exata ou nova, pela reflexão aguda ou profunda; não menos querem a originalidade, a simplicidade e a graça do dizer.

Machado de Assis
"Não morra vossa mercê, senhor meu, mas tome meu conselho e viva muitos anos, porque a maior loucura que pode cometer um homem nesta vida é deixar-se morrer sem mais nem mais, sem que ninguém o mate nem outras mãos o eliminem que as da melancolia."

(Sancho Pança a Dom Quixote, em seu leito de morte)

Hora do lanche

Acarajé

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Cuidado com o que você deseja... seu desejo pode um dia virar realidade...

Primogênita de Zeus que, aos 9 anos de idade, recebeu de presente de seu pai o colar usado por Prometeu que foi retirado dele ao pagar a sua pena por roubar o fogo dos deuses. Pandora, então, arranjou uma caixa para pôr seu colar, a mesma caixa em que ela guardou a sua mente e as lembranças de seu primeiro namorado, cujo nome era Narciso. A caixa podia apenas guardar bens de todo o tipo, com exceção de bens materiais. Como o colar era um bem material, ele se auto-destruiu. Para Pandora o colar tinha valor sentimental, o que a fez chorar por muitos dias seguidos sem parar. Como a caixa guardava lembranças com a intenção de sempre recordá-las ao "dono", Pandora sempre se sentia triste. Tentou destruir a caixa para ver se ela se esquecia do fato, mas não funcionou, a caixa era fruto de um grande feitiço, que a impedia de ser destruída. Pandora então, aos 36 anos, se matou. Não aguentou viver mais de 27 anos com aquela "maldição".

A lenda dos índios Cherokees

O pai leva o filho para a floresta durante o final da tarde, venda-lhe os olhos e deixa-o sozinho.
O filho se senta sozinho no topo de uma montanha toda a noite e não pode remover a venda até os raios do sol brilharem no dia seguinte.
Ele não pode gritar por socorro para ninguém.
Se ele passar a noite toda lá, será considerado um homem.
Ele não pode contar a experiência aos outros meninos porque cada um deve tornar-se homem do seu próprio modo, enfrentando o medo do desconhecido.
O menino está naturalmente amedrontado.
Ele pode ouvir toda espécie de barulho.
Os animais selvagens podem, naturalmente, estar ao redor dele.
Talvez alguns humanos possam feri-lo.
Os insetos e cobras podem vir picá-lo.
Ele pode estar com frio, fome e sede.
O vento sopra a grama e a terra sacode os tocos, mas ele se senta estoicamente, nunca removendo a venda.
Segundo os Cherokees, este é o único modo dele se tornar um homem.
Finalmente...
Após a noite horrível, o sol aparece e a venda é removida.
Ele então descobre seu pai sentado na montanha perto dele.
Ele estava à noite inteira protegendo seu filho do perigo.

Prato de arroz

"Um sujeito estava colocando flores no túmulo de um parente 
quando vê um chinês colocando um prato de arroz na lápide ao lado. 
Vira-se para o chinês e pergunta:
- desculpe-me, mas o senhor acha mesmo que o seu defunto virá comer o arroz?
E o chinês responde:
- Sim, e geralmente na mesma hora que o seu vem cheirar as flores!
 
"Respeitar as opções do outro "em qualquer aspecto" é uma das maiores
virtudes que um ser humano pode ter. As pessoas são diferentes, "agem
diferente" e pensam diferente. Nunca julgue. Apenas compreenda".

"A maneira de fazer é ser".
 
(Lao-Tsé)

"Nada é tão flexível como a língua da mulher, nada é tão pérfido como os seus remorsos, nada é mais terrível do que a sua maldade, nada é mais sensível do que as suas lágrimas".

 Plutarco

"Quando escrito em chinês a palavra crise compõe-se de dois caracteres: um representa perigo e o outro representa oportunidade". 

John Kennedy

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018


Andar de manhã

Durante as duas últimas semanas tenho começado os meus dias cometendo um furto. Não sei como evitar esse pecado e, para dizer a verdade, não quero evitá-lo. A culpa é de uma amoeira que, desobedecendo as ordens do muro que a cerca, lançou seus galhos sobre a calçada. Não satisfeita, encheu-os de gordas amoras pretas, apetitosas, tentadoras, ao alcance de minha mão. Parece que os frutos são, por vocação, convites a furtos: basta mudar a ordem de uma única letra… Penso que o caso da amoreira comprova esta tese linguística: tudo tem a ver com o nome. Pois amora é a palavra que, se repetida muitas vezes, amoramoramoramora, vira amor. Pois não é isso que é o amor? Um desejo de comer, um desejo de ser comido… O muro, tal como o mandamento, diz que é proibido. Mas o amor não se contém e, travestido de amora, salta por cima da proibição. Foi assim no Paraíso… Os poucos transeuntes que passam por ali àquela hora da manhã talvez se espantem ao ver um homem de cabelos brancos colhendo amoras proibidas. Mas, se prestarem bem atenção, verão que quem está ali não é um homem com cerca de 70 anos, é um menino. E como o próprio filho de Deus que disse que é preciso voltar a ser menino para entrar no Reino dos Céus, colho e como as amoras com convicção redobrada. E para que não pairem dúvidas sobre a inspiração teologal do meu ato, enquanto mastigo e o caldo roxo me suja dedos e boca, vou repetindo as palavras sagradas: “Tomai e bebei, este é o meu sangue…”. Ah! A divina amora, graciosa dádiva sacramental! Começo assim meu dia, furtando o fruto mágico que opera o milagre por todos sonhado de voltar a ser criança.

Assim revigorado no corpo e na alma por esse maná divino caído dos céus, prossigo na minha caminhada matutina. Ando não mais que 50 passos e estou sob uma longa alameda de pinheiros. Neles, não há nenhuma fruta que eu possa roubar, pois nada produzem que possa ser comido. Pinheiros não são para boca. São dádivas aos olhos. É cedo ainda. O sol acabado de nascer ilumina suas espículas verdes, que brilham como agulhas de cristal. Lembro-me de Le Corbusier, que dizia que “as alegrias essenciais são o sol, o espaço, e verde”. Mas os pinheiros sabem mais que o arquiteto, e às alegrias da luz acrescentam as alegrias do cheiro. Respiro fundo e sinto o perfume de resina.

Se me perguntarem no que penso, respondo com um verso Tao: “O barulho da água diz o que eu penso”. Penso as amoras, penso os pinheiros, penso a luz do sol, penso no cheiro da resina.

É tempo da floração das sibipirunas. Verdes e amarelas, elas cresceram dos dois lados da rua onde ando, transformando-a num longo túnel sombrio. Durante a noite, suas flores caíram, cobrindo a calçada e transformando-a num tapete dourado. Desço da calçada e ando no asfalto para não pisá-las. Lembro-me da voz misteriosa que falou a Moisés, de dentro da sarça que ardia: “Tira as sandálias dos teus pés, pois o chão onde pisas é santo”.

Para contemplar esse espetáculo, é necessário levantar cedo, pois logo as donas de casa e suas vassouras tratarão de restaurar no cimento a sua fria limpeza. Isso me dói, e com a dor vem o pensamento. Pergunto-me sobre a educação perversa que fez com que as pessoas se tornassem cegas para a beleza generosa das árvores, tratando suas folhas como se fossem sujeira. Mas as sibipirunas, indiferentes à cegueira dos homens e das vassouras repetirão o milagre durante a noite. Amanhã as calçadas estarão de novo cobertas de ouro.

Caminho um pouco mais e chego ao Bosque dos Alemães. Espera-me ali um outro deleite, o deleite dos ouvidos: há uma infinidade de cantos de pássaros que se misturam ao barulho das folhas sopradas pelo vento. Não estou sozinho. Fazem-me companhia muitas outras pessoas, entregues ao exercício matutino do andar e do correr. Estão ali por medo de morrer antes da hora. É preciso exercitar o coração. Mas parece que é só isso que exercitam. Pois, por mais que me esforce, não consigo perceber em seus rostos sinais de que estejam exercitando também o deleite dos olhos, do nariz ou dos ouvidos. Correm e caminham com olhos fixos no chão, graves e concentradas, compelidas pelas necessidades médicas. E, por causa disso, por não saberem ver e ouvir, não se dão conta de um comovente caso de amor que ali se desenrola.

Percebi o romance faz muito tempo, quando ouvi os gemidos que me vinham do alto. Lá em cima, longe dos olhares indiscretos, um gigantesco eucalipto e uma árvore de rolha se abraçam. Seus galhos entrelaçados revelam o amor dos namorados. Acho que fazem amor, pois quando o vento sopra fazendo suas cascas se esfregarem uma na outra, elas gemem de prazer… e dor.

Ando toda manhã. Por razões médicas, é bem verdade. Mas, mesmo que não existissem, andaria da mesma forma, pelos pensamentos leves e alegres que a natureza me faz pensar. Boa psicanalista é a natureza, sem nada cobrar, pelos sonhos de amor que nos faz sonhar.

Rubem Alves, no livro “As melhores crônicas de Rubem Alves”
"A maior desgraça de uma nação pobre é que, em vez de produzir riqueza, produz ricos. Mas ricos sem riqueza. Na realidade, melhor seria chamá-los não de ricos mas de endinheirados."

Versículo dia dia

"Mas o fruto do Espírito é amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade e fidelidade."

 Gálatas 5:22

domingo, 18 de fevereiro de 2018

Arqueólogos encontram cervejaria de 4500 anos no Egito

Pesquisadores da Universidade de Chicago encontraram evidências de um estabelecimento para produzir de cerveja e pão no Egito. A descoberta foi feita na cidade de Tell Edfu, próxima à cidade do Cairo, e data 2.500 a 2.400 a.C. – período do Antigo Império do Egito e da construção das pirâmides.

Tell Edfu vem sendo explorada por arqueólogos há 16 anos. Mas só no fim de 2017 foi encontrado um complexo de construções erguido pelos primeiros egípcios a ocupar a cidade. O complexo consiste em dois edifícios feitos de tijolos de barro, cercados de pátios e oficinas. Vasos e outros artefatos sugerem que o local era usado para produzir pão e cerveja. E fundir cobre.

Jarro encontrado no sítio arqueológico de Tell Edfu
Em sítio arqueológico de Tell Edfu, arqueólogos também encontraram evidências de produção de pães.

Padaria e cervejaria num só lugar faz todo o sentido. A cerveja surgiu no fim da Pré-História, com o começo da produção de cereais, na Revolução do Neolítico, ou talvez até antes. Era um jeito de preservar trigo e cevada, e era mais alimento que diversão. No Egito, era tão importante que era parte da ração diária dada aos construtores das pirâmides – 4 litros por dia.

“É uma descoberta maravilhosa, pois temos pouca informação sobre esse período de assentamentos nas províncias do sul”, afirma o professor Nadine Moeller, arqueólogo que co-liderou a escavação. “Não conhecemos nenhum outro complexo parecido do Antigo Império”, afirma.

No local, também foram encontrados nomes de oficiais inscritos em hieróglifo no piso, conchas do Mar Vermelho e cerâmicas da Núbia.

Os arqueólogos levantaram a hipótese de que o complexo abrigava oficiais responsáveis por supervisionar a exploração de metais preciosos no leste do Saara e consideram que Tell Edfu era um ponto de partida para as expedições egípcias para o leste da região, durante os governos da quarta e da quinta dinastia do Egito.

Fonte: Aventuras na história

Créditos: Aventuras na história