É curioso como não sei dizer quem
sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de
dizer, porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que
sinto como o que eu sinto se transforma lentamente no que eu digo. Ou
pelo menos o que me faz agir não é o que eu sinto mas o que eu digo.
Sinto quem sou e a impressão está alojada na parte alta do cérebro, nos
lábios - na língua principalmente -, na superfície dos braços e também
correndo dentro, bem dentro do meu corpo, mas onde, onde mesmo, eu não
sei dizer. O gosto é cinzento, um pouco avermelhado, nos pedaços velhos
um pouco azulado, e move-se como gelatina, vagarosamente. Às vezes
torna-se agudo e me fere, chocando-se comigo.
Mas sobretudo donde vem essa certeza de estar vivendo?
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