Foto: Joedson Alves / EFE
Pode-se até fantasiar que um dia deputados, senadores e governantes dispensarão seus salários e viverão exclusivamente de propinas, ou do que ganham nos seus pontos
Um dia o Internacional anunciou a contratação de um grande goleiro. Um
goleiro tão bom que muita gente estranhou. Como um jogador
extraordinário assim acabara no Inter, e — pelo que se soube — por muito
pouco dinheiro?
Mais estranho ainda: o grande goleiro não pedira um grande salário. Aí
alguém se lembrou de boatos que corriam sobre o jogador, que ele era um
entregador de partidas, um incorrigível subornável. E concluíram que ele
não se interessava pelo que ganharia no Inter, se interessava pelo que
ganharia de adversários no gol do Inter, deixando passar bolas
defensáveis. Se interessava pelo ponto.
São tantos os escândalos envolvendo políticos no Brasil, tanto dinheiro
rolando e tantos favores sendo vendidos, que se pode pensar em mandatos
e cargos públicos não como oportunidades de servir à população, mas
como pontos.
Quanto mais influente e destacado na hierarquia do poder, melhor
localizado e lucrativo o ponto do político. E corretores de jogo do
bicho, vendedores de drogas, mendigos e prostitutas sabem como é
importante um bom ponto.
Pode-se até fantasiar que um dia deputados, senadores e governantes
dispensarão seus salários e viverão exclusivamente de propinas, ou do
que ganham nos seus pontos.
O que, além de acabar com toda retórica vazia sobre razões nobres para
se eleger e servir à nação, trará um grande alívio para os cofres
públicos.
A Odebrecht e as outras grandes empresas corruptoras se encarregariam
de pagar aos políticos, para cada um de acordo com a localização do seu
ponto.
Quanto ao tal goleiro do Inter, só para não deixar a história pela
metade — o clube chegou a montar um esquema para vigiá-lo dia e noite.
Mas as suspeitas a seu respeito não se confirmaram. Pelo contrario, o
Inter deve boa parte do seu sucesso na época às suas defesas. Ele era
inocente. O que se pode dizer de cada vez menos políticos brasileiros.
Luís Fernando Veríssimo
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