Em vez de se entregarem à angustia moral, os americanos apenas se certificam de que a patifaria tenha proveito
Há uma certa faceirice na convicção de que somos os mais corruptos do
mundo. É esta nossa vocação para o amazônico. Queremos ser os maiores
até na falta de caráter. Mas toda a história deste lado do mundo, a
começar por Colombo, foi feita, de uma maneira ou de outra, por patifes.
Os americanos do Norte, por exemplo, têm um jeito de absorver seus
patifes sem danos à autoestima nacional. Esperam passar uma geração e os
transformam em heróis do empreendimento. O FDP de hoje é o desbravador
de amanhã e a fundação benemérita de depois de amanhã. Nomes como
Rockefeller, Morgan, Ford, Vanderbilt, Kennedy etc. conquistaram a
respeitabilidade pelo proveito social das fortunas que fizeram ou
herdaram, não importa como.
Em vez de se entregarem à angustia moral, os americanos apenas se certificam de que a patifaria tenha proveito.
Não existe exemplo maior da relação entre amoralidade empresarial e
esperteza de Estado do que o famoso complexo militar-industrial,
denunciado por ninguém menos esquerdista do que o presidente Eisenhower
no fim do seu governo.
Não deram muita bola para o velho general, e o complexo sobreviveu como instituição, garantindo os lucros dos fornecedores do Pentágono e dirigindo a política externa americana.
Claro que existem regras de conduta e um mínimo de recato nessa
promiscuidade consentida, e frequentemente prendem um FDP mais evidente.
Mas a regra universalmente aceita é de que o que é bom para os negócios
é bom para os Estados Unidos e para todo o mundo.
O maior escândalo da promiscuidade revelada pela operação Lava-Jato, no
Brasil, além de expor a extensão do capitalismo de compadres praticado
por aqui e há anos sem que ninguém se importasse muito, é o proveito
restrito das nossas negociatas. A velha máxima de que é só deixar os
ricos se lambuzarem que alguma coisa sobrará para os outros não
funciona. Aqui funciona um complexo no modelo americano, com a diferença
que nada escorre desse pote de melado.
No Brasil, modificou-se a frase do Balzac. Por trás de toda grande fortuna, pior do que um crime, existe um desperdício.
Luis Fernando Veríssimo
Fonte aqui
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