sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Vida, morte e tempo

Existem certos autores que não perdem a capacidade de falar aos pósteros de forma sempre atual, mesmo que se passem anos. Alguns textos de Machado de Assis e Eça de Queirós, por exemplo, guardam frescor e atualidade, embora tenham sido escritos há mais de um século.

Vejo outros escritores portugueses, como Miguel Sousa Tavares, escreverem com mais dependência a seu tempo do que Queirós ou José Saramago – outro que não deve perder o vigor de seus escritos com o passar do tempo.
Mais inusitado ainda é ler as cartas do filósofo romano Sêneca enviadas a seu amigo Lucílio durante o século inicial da era cristã. São textos que tratam de temas variados e devem ter sido redigidos entre 63 e 65 d.C. O título das cartas é “Aprendendo a viver” em uma edição da L&PM.
Em seu manual sobre a vida, Sêneca nos dá grandes lições a respeito de questões essenciais. A primeira delas refere-se ao tempo, tema que muito me agrada. Para Sêneca, é lamentável perder tempo por negligência, já que o tempo que já passou pertence à morte.
Em sendo um bem escasso e que não é suficiente nem mesmo para as coisas necessárias, o tempo não deve ser gasto com coisas supérfluas. Para Sêneca, isso é um absurdo. Ele diz ainda que a velocidade do tempo é infinita, em especial quando olhamos para trás.
Sempre ouvimos os mais velhos falarem que as coisas acontecem rápido demais e que parece que foi ontem que um filho adulto nasceu ou algo assim. Ao refletir sobre isso, lembro-me que Chico Xavier afirmou que o maior arrependimento dos espíritos no Além é pelo tempo perdido, gasto de forma não relevante.
Considerando Sêneca e Chico Xavier, depreendo que o tempo gasto de forma consequente contribui para uma vida melhor após a morte, e que o tempo gasto de forma inconsequente será um peso mais adiante.
Enfim, Sêneca considera que o único bem que o indivíduo tem é o seu tempo, que é fugaz e escorregadio. Escorre pelas mãos, como disse Lulu Santos. A solução para lidar com bem tão perecível é lançar-se ao presente e ser menos dependente do amanhã.
Penso que lançar-se ao hoje com intensidade e energia é a melhor maneira de fugir da morte. Até mesmo considerando o dia uma pequena vida que deve ser planejada, com seu começo, meio e fim.
A questão posta por Sêneca não deve ser considerada uma ode aos workaholics e sim um alerta sobre como devemos usar nosso tempo, hoje. Nem que seja no ócio, ou em leituras, em viagens, no trabalho e nos estudos.
Finalizando, com Sêneca: vive quem é útil a si e ao próximo. Aqueles que se entorpecem, ainda que vivos, vivem em casa como se estivessem em sepulturas.

 
Murillo de Aragão é cientista político


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