Se existe alguma
coisa que justifica o surgimento do ser humano neste planeta é ele ter concebido
a matemática, e digo aqui a matemática no seu sentido mais amplo, que inclui a
geometria, a aritmética, a música, a zorra toda. Não quero dizer que ela seja
mais importante do que tudo, e na verdade acho que está muito longe disso. A
coisa mais importante da vida é a felicidade do corpo, o em-paz do corpo, o
na-ponta-dos-cascos do corpo, o turbinas-a-toda-potência do corpo, a
alegria-de-viver do corpo, o vou-tomar-todas-porque-sou-indestrutível do corpo.
O corpo, a
gente joga a toalha: o corpo é a base do real. A matemática é simplesmente o
vislumbre da perfeição.
A matemática nos sugere o
possível mundo Trans-Humano do futuro, em que todos seremos mente pura, gravada
em elétrons e silício, livres das dores, das carências e da decadência do corpo.
Não sei o que sente o corpo alheio, mas os prazeres e os achaques do meu me
bastam. Tenho dias sempre movimentados. O corpo ocupa cada um de nós 24 horas
por dia. É único e não se conecta em rede. Talvez por isso nunca consegui ver o
arco-íris que tantos outros viam, a estrela cadente que tantos apontavam, o
fantasma que todo juravam trêmulos que estava ali, diante de nós. Pobre de mim,
que vejo uma ciclóide e não vejo um fantasma.
Quando conseguirmos
transformar em .gifs animados tudo que sabemos sobre o espaço e suas dimensões.
Quando conseguirmos codificar isso numa tecnologia que qualquer raça, por mais
física e quimicamente diferente de nós, consiga reproduzir e utilizar. Quando,
enfim, pudermos revelar a uma raça alienígena qualquer o que descobrimos sobre a
matemática pura do Universo, somente então teremos justificado nossa presença na
Terra. Talvez nossa aritmética e nossa geometria (nossos lados digital e
analógico) não sejam perceptíveis por todas as espécies inteligentes que há. Faz
sentido. Mas também faz sentido supor que exista alguma semelhante à nossa, ou
pelo menos capaz de ver como vemos e raciocinar como raciocinamos, pouco importa
sua aparência anatômica ou sua composição química.
Imagino um mundo distante,
um mundo submarino com uma civilização compartilhada entre cetáceos e
cefalópodes, e onde um dia cheguem, sabe-se lá como, demonstrações cabais da
existência de que existia, num passado remoto, um raciocínio abstrato em termos
visuais, no terceiro planeta em volta de uma estrela periférica. Eles olharão
aquilo e comentarão: “Vejam só, eram mamíferos antropóides de superfície,
respiravam oxigênio, e mesmo assim conheciam o Yamigang do Kambalaôr.” (É assim
que chamam o “Teorema de Pitágoras” na cultura deles.)
Bráulio Tavares
(mundofantasmo)
(mundofantasmo)
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