O ministro Joaquim Barbosa, do STF,
indeferiu pedido de liminar formulado por governadores de seis Estados contra a
fixação do reajuste do piso salarial dos professores pelo Ministério da
Educação. Os autores da ação alegam que cabe aos Estados, não ao ministério,
decidir sobre a matéria. Barbosa discordou.
Sancionada em 2008, a lei que criou o piso
salarial dos professores (11.738)
atribuiu à pasta da Educação a prerrogativa de definir o índice anual de
reajuste. Sob Aloizio Mercadante, o MEC adotou como parâmetro para a
definição do aumento o valor gasto por aluno no Fundeb (Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica).
Com base nesse critério, o reajuste de 2012 foi fixado em 22,22% –bem superior à taxa oficial de inflação de 2011, que foi de 6,08%. Vitaminados pelo aumento real, os contracheques dos professores foram de R$ 1.187 para R$ 1.451 por mês. É pouco para quem recebe. Mas os governadores alegam que lhes falta caixa. Daí o recurso ao STF.
A petição é pluripartidária. Assinaram a peça os governadores do Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB); de Goiás, Marconi Perillo (PSDB); do Piauí, Wilson Martins (PSB); de Roraima, José de Anchieta Júnior (PSDB); de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD); e até o do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, filiado ao mesmo partido do ministro Mercadante, o PT.
Chama-se Ação Direta de Inconstitucionalidade a ferramenta jurídica usada pelos governadores para tentar brecar o reajuste definido por Mercadante. Em essência, alega-se que o artigo que transferiu para o MEC o poder de definir os aumentos viola a Constituição, cujo texto confere aos Estados autonomia para deliberar sobre seus orçamentos.
Os governadores incluíram na ação o pedido de liminar (decisão provisória, tomada antes do julgamento definitivo da causa) sob a alegação de que o reajuste definido pelo MEC submete a saúde financeira dos Estados a riscos imediatos. Algo que, no latinório dos advogados, é chamado de ‘periculum in mora’. No despacho em que indeferiu a liminar, Joaquim Barbosa, relator do processo, recordou que os governadores já haviam protocolado uma outra ação contra o piso dos professores.
Nessa primeira ação, questionava-se a constitucionalidade do próprio piso salarial. Ao julgá-la, o STF postou-se ao lado dos professores. Considerou que a novidade instituída há quatro anos não fere o texto da Constituição. O piso foi mantido em pé. Barbosa estranhou que os governadores não houvessem questionado no recurso anterior o pedaço da lei que autoriza o MEC a ditar os reajustes.
O ministro anotou: “Essa omissão sugere a pouca importância do questionamento ou a pouco ou nenhuma densidade dos argumentos em prol da incompatibilidade constitucional do texto impugnado, de forma a afastar o periculum in mora.” Traduzindo para o português das ruas: na opinião de Barbosa, o pedido de liminar não faz nexo. Se o perigo fosse tão evidente e iminente, os governadores teriam se mexido antes.
De resto, Barbosa recordou que a lei do piso prevê que, quando Estados e municípios não dispuserem de caixa para honrar os salários dos professores, a União é obrigada a complementar a diferença. Assim, realçou o ministro, a alegação de risco à higidez financeira dos Estados só faria sentido se ficasse comprovado que o governo federal coloca “obstáculos indevidos” ao repasse dos complementos.
“Sem a prova de hipotéticos embaraços por parte da União, a pretensão dos requerentes equivale à supressão prematura dos estágios administrativo e político previstos pelo próprio ordenamento jurídico para correção dos déficits apontados”, escreveu Barbosa.
O ministro repisou a tecla: o STF já decidiu que o piso é constitucional. E não há na Constituição nenhum artigo que autorize Estados e municípios a deixar de prever em seus orçamentos anuais o dinheiro necessário à cobertura dos gastos obrigatórios. Entre eles o salário dos professores.
Com base nesse entendimento, Barbosa concluiu: no momento, quem corre riscos são os professores, não os Estados. “Se não houver a obrigatoriedade de revisão periódica dos valores, a função do piso nacional poderia ser artificialmente comprometida pela simples omissão dos entes federados. Essa perda continuada de valor forçaria o Congresso Nacional a intervir periodicamente para reequilibrar as expectativas.”
Assim, enquanto o STF não julgar o mérito da ação, os governadores serão obrigados a pagar o piso dos professores nos valores fixados pelo MEC. Não há prazo para que Barbosa leve o julgamento da encrenca ao plenário do Supremo. Como que antevendo o malogro do questionamento, os governadores incluíram na ação uma reivindicação secundária.
Na hipótese de o STF concluir que são constitucionais os poderes atribuídos ao MEC, pedem que o tribunal ao menos adote a interpretação segundo a qual os reajustes definidos em Brasília não têm validade nacional. Valeriam apenas para as escolas federais, não para as estaduais e municipais. Uma tese dura de roer.
Por Josias de Souza
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