A oração mais eficaz é aquela feita na intimidade do coração, numa
experiência de total gratuidade, num diálogo amoroso e filial com o
Pai.
A oração do Pai-Nosso é o resumo de todo o Evangelho e o modelo por excelência de toda oração cristã. (Unsplash/ Josh Applegate)
A oração é um privilegiado lugar onde cultivamos a amizade com o Senhor.
Ela brota do mais profundo do nosso coração, na esperança viva que há
um “Interlocutor” que nos ama e conhece todo o nosso ser. “A oração
consiste na comunhão continuada com Deus, com quem se está sempre em diálogo,
a quem se escuta em cada instante do dia e a quem se procura responder
com a mais total transparência e desejo de ser obediente. Existem
momentos específicos, ao longo do dia, para se entregar à oração.
Entretanto, ao se dizer o ‘amém’ final, a vida de oração não fica em
suspenso até o próximo momento, em que se deixará tudo para ficar a sós
com Deus. Antes, ela continua e, em determinadas circunstâncias, no auge
da ação, poderá acontecer de forma até mais intensa e comprometedora”
(Jaldemir Vitório).
Jesus foi um homem orante. Ele estava sempre em
diálogo com o Pai. Nos momentos decisivos de sua vida e de sua missão,
sempre O encontramos em oração ao Pai. Ele, porém, não se preocupou em
ensinar longas orações aos seus discípulos. Para Ele, a oração mais
eficaz é aquela feita na intimidade do coração, numa experiência de
total gratuidade, num diálogo amoroso e filial com o Pai, sem a
necessidade de repetir longas fórmulas somente para ser visto pelos
outros. “Quando fores rezar, entre no teu quarto, (no teu interior, no mais profundo do seu ser, onde somente Deus habita), fecha a porta (entrega sua vida nas mãos de Deus, coloque Deus no centro da sua oração, dê espaço para que Deus possa ser Deus na sua vida)
e reza a teu Pai em segredo. E teu Pai, que vê o escondido, te pagará”
(Mt 6, 6). Não que Jesus quisesse uma espiritualidade intimista,
desligada da vida, mas, para Ele, as palavras que saem dos nossos lábios
devem estar em sintonia com o nosso coração e a nossa vida, numa
misteriosa correspondência entre as profundezas do coração e as alturas
do céu.
Os discípulos de Jesus observavam o seu jeito de falar com
o Pai e, certamente, percebiam algo novo em sua oração, por isso pedem a
Jesus que os ensine a orar (cf. Lc 11,1). Não que eles não soubessem as
orações judaicas. Os salmos, por exemplo, eram a oração comum dos
judeus. Mas eles queriam aprender dos lábios do Mestre esse jeito novo
de falar com Deus. Então Jesus, partindo da sua própria experiência de
oração, ensina os seus discípulos a falarem com Deus-Pai na liberdade de
filhos e na responsabilidade de irmãos.
A oração do Pai-Nosso é o
resumo de todo o Evangelho e o modelo por excelência de toda oração
cristã. Enquanto filhos no Filho, pelo batismo, podemos nos dirigir a
Deus como Pai, e, sendo Pai, é também Senhor de nossas vidas. Por isso, o
nosso maior desejo deve ser pela vinda do Reino e que a vontade de
Deus, que é vida plena para todos, se realize no mundo. Essa perspectiva
da vinda do Reino de Deus une as duas partes da oração ensinada por
Jesus. Pois sendo todos filhos de Deus-Pai, somos chamados a viver a
fraternidade de irmãos (cf. Mt 23,8), repartindo o pão entre todos e
vivendo relações de perdão e misericórdia para com o nosso próximo. Pois
esquecer o outro ou fazer-se indiferente ao rosto que fala é “aprisionar
a glória de Deus” (cf. Rm 1, 18-20). Como afirma Dietrich Bonhoeffer,
“a minha fome é uma questão biológica, a fome do outro é uma questão
teológica. É um apelo de Deus, tenho que encontrar Deus saciando a fome
do outro”.
Os discípulos pedem a Jesus que os ensine a orar, mas o
Pai-Nosso é mais do que uma oração, é, na verdade, o modo de viver e
agir como seguidores de Jesus. Como nos recorda um antigo adágio da
Igreja “lex orandi, lex credendi e a lex agendi”, isto é,
agimos conforme oramos e cremos. Quando rezamos mal, nossa fé e nossa
ação no mundo também ficam fragilizadas. Por isso precisamos pedir
sempre ao Senhor que nos ensine a orar. Porque, com o individualismo que
invadiu as igrejas, nossas orações se transformaram num intimismo
egoísta, perdendo a centralidade do Pai e do seu Reino. Nossa oração
parece ter deixado de ser uma busca pela realização da vontade de Deus
para que Ele faça a nossa vontade. Ao invés de perguntarmos: “Senhor, o
que Tu queres que eu te faça?”, nós pedimos: “Senhor, o que Tu podes
fazer por mim?” Com isso, a nossa oração deixou ser para nós norma da fé e do agir no mundo, transformando-se num devocionismo vazio e descomprometido.
Faz-se
necessário voltarmos a aprender dos lábios de Jesus como nos dirigir a
Deus, a fim de que a nossa oração seja sempre mais esse encontro amoroso
e gratuito com o Pai, e, estando na presença de Deus na oração, abramos
nossos olhos para perceber o sofrimento e a dor dos nossos irmãos e
irmãs. Pois “seremos tanto mais filhos do Pai quanto mais formos irmãos
dos nossos irmãos, dividindo e repartindo com eles o nosso pão e
perdoando-lhes as ofensas” (Antônio Batista Vieira).
Que o Pai
nosso que estás no céu nos livre da tentação de uma oração
descomprometida com a vida dos pobres e dos sofredores e nos ajude a
viver na comunhão com Deus e com os irmãos, repartindo o pão de cada dia
e perdoando-nos uns aos outros assim como somos perdoados pelo nosso
Pai misericordioso.
*Pe. Rodrigo Ferreira da Costa, SDN, Missionário Sacramentino
de Nossa Senhora, Licenciado em Filosofia (ISTA), bacharel em teologia
(FAJE), com Especialização para Formadores em Seminários e Casas de
Formação (Faculdade Dehoniana). Publicou pela Editora O Lutador (2015) o
livro “Equipes Missionárias: rosto de uma Igreja em missão”. Trabalha
atualmente na Paróquia Santa Cruz, Alta Floresta-MT.
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