Povinho danado esse, viu? Meu colega escritor Ariano contava
que sempre ia aos domingos tomar caldo de cana e comer pão doce no
mercado São José, em Recife. Na porta um ceguinho mendigava e
Suassuna lhe dava uma grana. Foram tantos anos de esmolas que o ceguinho
identificava Ariano pelos passos. Um dia saudou: “- Seu Ariano, estou precisando de um favor seu”. Meu colega escritor se pôs ao dispor.
“- Sabe o que é, seu Ariano? É que eu gostaria que o senhor adiantasse
quatro semanas de esmolas porque eu vou tirar um mês de férias”. É, amigos leitores, no Brasil é assim.
Esses brasileiros são fantásticos mesmo quando confessam crimes. Prestem atenção nessa história absolutamente verdadeira. Numa
cidade do nosso interior o cidadão tinha uma bodega onde vendia de um
tudo, inclusive água mineral, pela qual cobrava 1 real a garrafa. Um concorrente estabeleceu-se bem em frente a ele e começou a baixar os preços. Para vocês terem uma ideia do estrago, a água mineral que ele vendia a 1 real o concorrente passou a vender a cinquenta centavos. Claro que ele ficou possesso. Passava o dia reclamando aos clientes, encostado no balcão. “-
Tá vendo só, seu Francisco. Eu trabalho que nem um condenado todo dia
há mais de 20 anos. Aí vem um amarelo safado desses e quer me quebrar. O
senhor imagine que ele está vendendo a agua mineral pela metade do meu
preço. E olha que eu tenho fabricação própria. É um marginal”.
Esses brasileiros são incríveis. Numa outra cidade de nosso interior um desses nossos conterrâneos era conhecido por não pagar suas contas. Um dia ele foi à loja de seu Eurípedes e disse que queria comprar a tesoura que estava na vitrine. O seu Eurípedes, antevendo o prejuízo com o calote, tentou convencê-lo a não comprar a tesoura em sua loja: “- Compadre, na loja de dona Chiquinha essa tesoura está pela metade do preço, é melhor você comprar lá”. Mas o velhaco não deu trégua: “-
Ah não, compadre Eurípedes, não vou fazer uma desconsideração dessas
com você. E tem mais, já dei minha palavra, vou comprar é aqui”. Essa discussão demorou quase uma hora, e enfim
o dono da loja cansou. Foi buscar a tesoura e a promissória a vencer em
30 dias para o caloteiro assinar. Preencheu a promissória e quando
terminou, deu um suspiro e desabafou: “- Olha aqui, compadre,
eu sei que o senhor não vai pagar essa promissória, mas que eu botei pra
lascar no preço, ah, isso eu botei”.
Eita povinho que eu amo.
Marcos Pires
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