Manoel de Araújo Vieira, o Noé de Belém do Brejo do Cruz-PB
O Brasil assim como o nordeste é um celeiro de diversidade cultural e folclórico. É muito comum nas pequenas cidades do interior se encontrar, em qualquer uma de suas esquinas pessoas muito simples, comuns, criaturas do povo, ricas em histórias, e que representam por si só a mais autêntica encarnação natural do anedotário sertanejo.
Foi nesse cenário que, juntamente com os amigos Paulo e Gutemberg, nos encontramos, em São Bento-PB, no restaurante curiosamente chamado de “O pinto”, com o cidadão Manoel de Araújo Vieira, o Noé de Belém do Brejo do Cruz-PB.
Ali, na boa companhia, almoçamos e tivemos a oportunidade de tirar um dedinho de prosa com o Manoel.
Noé, como é por todos conhecido em Belém do Brejo do Cruz-PB, lá onde o vento rodopia e faz a curva, é paraibano e tem 45 anos, casado com a Sra. Verônica, 5 filhos e 2 netos que faz questão de trazer no rastro, representa uma daquelas figuras de poucas letras mas que se tornou um professor Pardal na universidade da vida. Irreverente e contador de “causos” tem sempre uma boa resposta pronta na ponta da língua.
Diante de um caboclo desse o cabra metido a doutor precisa ter cautela, pesar bem as palavras, caso não queira sair no prejuízo do gracejo. Obviamente que falei pouco e ouvi muito. O momento, sem dúvidas, era de pura aprendizagem com aquele pacato homem do povo.
Mas, sabedor que Noé é dado a arte de consertar ventiladores e que, segundo ele, aprendeu na "tora", além de, vez enquando, se aventurar em outros diversos ofícios vi ali a oportunidade de, quem sabe, ter encontrado o reparo para um velho relógio de estimação, o que fui, prontamente desencorajado: - Doutor, não conserto relógios, inda mais esse que anda de frente pra trás. Não é o meu ramo. Cada quá no seu cada quá!. Asseverou Noé.
De certo mesmo é que o episódio cuidou de lembrar-me do sempre e bom Ariano Suassuna, o grande Ariano, sempre ele.
Conta-nos Suassuna que certa vez um sociólogo foi a Taperoá-PB, a sua terra natal, para realizar uma pesquisa sociocultural. Queria medir o nível de conhecimento do homem do povo, naquela região. Encontrou um vendedor de peixes com o seu balaio cheio de tilápias, curimatãs, tucunarés, caraopebas e traíras. Passou a entrevistá-lo:
“-O senhor sabe onde fica o Distrito Federal
-Eu não sei não, senhor.
-O senhor sabe o nome completo do Ministro da Educação?
-Eu não sei não, senhor.
-O senhor sabe a cotação do dólar?
-Nem sei o que é dólar, nem sei o que é cotação.
-Então o senhor é ignorante mesmo, não é?
O vendedor de peixes não se deu por vencido. Puxou uma tilápia e perguntou:
-O senhor sabe que peixe é este?
-Não sei, respondeu o sociólogo-entrevistador.
-O senhor saber que peixe?, perguntou o vendedor, exibindo uma curimatã.
-Não sei, respondeu o sociólogo.
-E o senhor sabe me dizer que peixe é este, perguntou pela terceira vez o vendedor, exibindo agora um tucuné.
-Não sei, de novo respondeu o sociólogo.
-Pois é, seu moço, concluiu o vendedor. Cada quá com a sua ignorância!”
E assim, terminamos o almoço e nos despedimos com uma renovada promessa de um novo encontro, quem sabe com mais alguém que ao menos entenda de relógios, desses que andam de frente pra trás, quem sabe...
Teófilo Júnior
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