sábado, 16 de fevereiro de 2019

Clarice Lispector

“Fiz o que era mais urgente: uma prece. Rezo para achar o meu verdadeiro caminho.
 Mas descobri que não me entrego totalmente à prece,
 parece-me que sei que o verdadeiro caminho é com dor.
 Há uma lei secreta e para mim incompreensível: 
só através do sofrimento se encontra a felicidade.
 Tenho medo de mim pois sou sempre apta a poder sofrer. 
Se eu não me amar estarei perdida 
 porque ninguém me ama a ponto de ser eu, de me ser.
 Tenho que me querer para dar alguma coisa a mim. 
Tenho que valer alguma coisa?  Oh protegei-me de mim mesma, que me persigo.  Valho qualquer coisa em relação aos outros
 mas em relação a mim, sou nada.
É tão bom ter a quem pedir.  Nem me incomodo muito se eu não for totalmente atendida.  Eu peço a Deus para eu ser mais bonita  e não é que meu olho faísca ao mesmo tempo que meus lábios parecem mais doces e cheios?  Eu peço a Deus tudo o que eu quero e preciso.  É o que me cabe. Ser ou não ser atendida 
 isso não me cabe a mim, isto já é matéria-mágica que se me dá ou se retrai. 
Obstinada, eu rezo. Eu não tenho o poder.  Tenho a prece."

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