Se a alguém ainda restavam
dúvidas sobre qual é a definição mais adequada a respeito do regime comandado
por Nicolás Maduro na Venezuela, elas se dissiparam nas últimas horas. A
famigerada convocação, nos termos inconstitucionais em que foi feita, de uma
nova Assembleia Nacional Constituinte cujo maior objetivo é afrontar um
Parlamento legitimamente eleito e de maioria opositora, o recrudescimento da
repressão violenta às manifestações populares contra o presidente e as
detenções dos líderes oposicionistas Leopoldo López e Antonio Ledezma, que
cumpriam prisão domiciliar e agora voltam à cadeia sem qualquer justificativa
legal, revelam de forma categórica que já não há margem para relativismos
quando se fala sobre o governo venezuelano. Trata-se de uma ditadura
escancarada, um regime autoritário e violento, uma tirania que reprime
protestos democráticos, censura a imprensa independente, interfere nos demais
Poderes da República e prende adversários políticos.
A ditadura de Maduro está
efetivamente instalada e, se ainda não se transformou em um regime totalitário,
isso se deve unicamente à forte e corajosa reação de uma parcela amplamente
majoritária da sociedade venezuelana, que vem lutando nas ruas pela liberdade e
contra o arbítrio. Documentos obtidos pela Organização dos Estados Americanos
(OEA) que devem servir como base para uma eventual denúncia de crimes contra a
humanidade cometidos pelo regime apontam que o país tem nada menos que 440
presos políticos, o maior número desde o fim do período militar de Marcos Pérez
Jiménez, entre 1952 e 1958. Segundo a procuradora-geral da Venezuela, Luísa
Ortega, que já foi próxima do bolivarianismo e hoje é demonizada e perseguida
pelos governistas, mais de 120 pessoas morreram e quase 2 mil se feriram desde
a eclosão dos protestos de rua. Somente no último fim de semana, em que se
realizou a farsa da votação da Constituinte, ao menos 15 pessoas perderam a
vida. Além do Brasil, que se manifestou com firmeza contra a ditadura de
Maduro, países como Estados Unidos, Espanha, Argentina, México, Colômbia, Peru,
Paraguai, Panamá, Costa Rica, Chile e Canadá anunciaram que não reconhecem a
legitimidade da eleição e solicitaram que a nova Assembleia Constituinte não
seja instalada.
Lamentavelmente, alguns setores
da esquerda mundo afora, e também muito especialmente no Brasil, defendem
abertamente a ditadura venezuelana. Em notas oficiais, PT, PCdoB e PSOL tiraram
a máscara e desnudaram sua verdadeira face ao apoiar declaradamente um regime
responsável por tamanha atrocidade. Muitos de nós, do campo da esquerda, que
cometemos equívocos históricos no passado – entre os quais a ausência de uma
visão democrática, certamente a principal causa da derrota do socialismo real
–, fizemos uma profunda autocrítica a partir da qual a democracia passou a ser
compreendida como valor universal e inegociável. Infelizmente, alguns grupos
que se dizem progressistas e participaram da luta contra a ditadura militar no
Brasil agora condescendem ou mesmo apoiam o regime autoritário venezuelano.
Talvez seja este o pior legado do lulopetismo – uma herança mais grave e
perversa, inclusive, do que a própria corrupção.
De certa forma, esses setores
mais atrasados da esquerda, que contemporizam com ditaduras desde que elas
estejam alinhadas com determinado viés ideológico, são responsáveis pelo
fortalecimento de um segmento igualmente populista e reacionário, mas de uma
extrema-direita que defende não só a ditadura militar instalada por mais de
duas décadas no Brasil, mas as torturas por ela praticadas naquele período de
triste memória. Essas forças, que aparentemente se contrapõem nos extremos do
espectro político, acabam, na verdade, por se retroalimentar e devem ser
combatidas com altivez por todos aqueles comprometidos com os valores
democráticos.
É por isso que o PPS, já há
muito, defende a unidade de todas as forças democráticas para que, nas eleições
de 2018, seja oferecida aos brasileiros uma alternativa fora da nefasta
polarização entre uma esquerda atrasada que tanto mal causou ao país nos
últimos 13 anos e uma extrema-direita de corte claramente fascista. A
construção desse projeto para o Brasil se faz ainda mais necessária neste
momento, sobretudo quando observamos o desastre que tomou conta da Venezuela
após tantos desmandos perpetrados por governos populistas e antidemocráticos.
Aos irmãos venezuelanos, toda a
solidariedade e o apoio para que resistam, derrotem a ditadura e se reencontrem
com a liberdade. Ao PT e seus satélites, fica apenas a nossa indignação. O
lulopetismo envergonha o Brasil novamente, desta vez por se associar a uma
tirania sanguinária e cruel.
Roberto Freire é deputado federal
por São Paulo e presidente nacional do PPS
Diário do Poder
Nenhum comentário:
Postar um comentário