quinta-feira, 10 de julho de 2014

Senhor, salve-nos dos entendidos em futebol

Sei que não vou ser lido, sequer compreendido, mas não importa, vou dizer: estou farto dos palpiteiros. Quem não percebe a fatalidade de ontem! Já Ésquilo, príncipe dos trágicos, disse como ninguém: "a inteligência nada pode contra a fatalidade" [Prometeu Acorrentado]. Ninguém melhor que, o saudoso e esclarecido, Nelson Rodrigues para nos explicar: "E o que a Seleção, e antes da Seleção, o que sofreu o futebol brasileiro nas mãos dos 'entendidos'. Tenho que abrir, neste momento, um tópico especial. O que é o 'entendido'? Veremos se posso caracterizá-lo. É o cronista que esteve em 66, na Inglaterra, e voltou com a seguinte descoberta: - o futebol europeu em geral, e o inglês em particular, eram muito melhores do que o nosso. Estávamos atrasados de quarenta anos para mais. Quanto à velocidade, era uma invenção européia. Os brasileiros andavam de velocípede, os europeus a jato. O 'entendido' afirmava mais: - os times de lá não deixavam jogar. Essa foi genial. Imaginem vocês um time jogando e o adversário assistindo, como numa frisa de teatro... Vou concluir: - o 'entendido' só não se torna abominável porque o ridículo o salva”. [O Globo, 10/6/1970].
 
Tão próximo dessa abominação é a falta de gratidão, por isso concluo com o que já disse sobre esse acaso: Tem a contradição da vida: a vergonha evita a vergonha. A nobre alma alemã está constrangida. Tão respeitosa entrou, tão envergonhada saiu. Não porque perdeu, mas porque ganhou. Nícolas Gómez Dávila constatou que “vencer um idiota nos humilha”. Isto vale em qualquer duelo. Não é diferente no futebol. Nossa desorientação em campo parecia uma embriaguez, uma idiotia por desfunção. 
 
A Seleção Canarinho tão honrada de suas chuteiras, parecia descalça delas numa várzea. Assim encontrou-a a alemã. Assim não gostaria de encontra-la. Outra vez ela deseja nos encontrar, mas com uma condição: que não nos encontre descalços e que não esqueçamos as nossas lágrimas, pois toda grande alma estima o dom e a santidade das lágrimas. “Tudo vale a pena se a alma não é pequena” disse o poeta Fernando Pessoa, também diz o bom brasileiro: valeu Seleção, receba minha gratidão!
 
 
Euphario Torquato

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