Um dos vícios mais
recorrentes na apreciação de um livro, consequência de um ensino errado de
literatura no colégio, é ter que perguntar, como num guia do professor: “Qual a
mensagem do livro? Qual a idéia que o autor quis transmitir?” E coisa e tal. Não
estou dizendo que um livro não possa ter uma mensagem. Há muitos que têm, mas
geralmente são os mais chatos e desnecessários. Foram provavelmente escritos por
pessoas que ouviram esse tipo de questionário na escola, e a partir daí
começaram a ler os livros em busca da mensagem de cada um. Acabam largando os
livros rapidinho ao perceber que eles não têm mensagem nenhuma, ou têm duas ou
três mensagens contraditórias, ou têm milhares de mensagens que não batem umas
com as outras, etc.
Um dia esses leitores tornaram-se escritores. Seu processo criativo, provavelmente, passou a acontecer assim: 1) Conceber uma mensagem, geralmente com o objetivo de ensinar a alguém alguma lição-de-vida útil; 2) Imaginar uma situação em que essa mensagem seja necessária para um personagem ou grupo de personagens que a desconhecem; 3) Fazer com que, no momento culminante, perto do fim, um dos personagens diga a mensagem, de forma clara e inequívoca, aos demais. (E ao leitor.)
É a existência desse tipo de literatura simplória que acaba prejudicando o restante, porque começam a cobrar esse tipo de mensagismo rudimentar aos livros de verdade – e a considerá-los livros defeituosos, “herméticos”, “elitistas”, quando descobrem que eles não funcionam dessa forma. Ficam como certos leitores de fábulas (de Esopo, de La Fontaine, etc.) para quem a “moral da história” é o que importa, e a história está ali só para justificar a moral. (Por isso as melhores fábulas são somente a história, e deixam a “moral” para ser descoberta – ou inventada – por quem lê.)
Uma ótima resposta para isso é a do dramaturgo Harold Pinter, que uma vez recebeu uma carta de uma espectadora de sua peça “The Birthday Party”. A madame dizia: “O sr. pode me informar o significado desta sua peça? Há três pontos que não compreendi: 1) Quem são os dois homens? 2) De onde veio Stanley? 3) Devemos considerá-los normais? Espero que o sr. entenda que sem as respostas a estas perguntas não poderei entender sua peça.”
Pinter respondeu: “Prezada senhora: Ficaria grato se me explicasse o significado de sua carta. Há três pontos que não compreendi: 1) Quem é a senhora? 2) De onde a senhora vem? 3) Devo considerar que a senhora é normal? Espero que a sra. entenda que sem as respostas a estas perguntas não poderei entender sua carta.”
E nada mais disse nem lhe
foi perguntado.
Bráulio Tavares
Nenhum comentário:
Postar um comentário