Sou pai de primeira viagem. Tenho
um filho de oito anos, de modo que ainda estou, de certa forma, debutando no
exercício de ser pai. De outro norte, se me falta experiência como pai,
sobra-me o histórico de ser filho.
A prima facie, compreendo que educar não é tarefa das mais fáceis e envolve
uma série de fatores convergentes, alguns de cunho subjetivo, emocional e até
histórico. Não me filio a corrente de que a educação ou os métodos educacionais
se enquadram em receitas prontas, em forma geométrica pré-definida ou em
tipificações legais impostas pelo Estado, cujo resultado me sugere duvidoso.
Embora me sinta tentado,
reservo-me aqui em não adentrar propriamente nas nuances técnicas da “Lei da
Palmada”, atualmente também batizada de “Lei menino Bernardo”, e seus aspectos
jurídicos mais profundos para ater-me a questões que a circundam. Por exemplo, o
projeto de lei já aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara
Federal, na prática, como se dará a sua efetividade normativa? Será que o
preciosismo jurídico não resultará tão somente na elaboração de mais uma lei
dentro do universo sobejamente já entulhado e empilhado de normas?
A
proposta de lei proíbe pais e responsáveis legais por crianças e adolescentes
de baterem nos menores de 18 anos. Aprovada em caráter terminativo, seguirá
diretamente para análise pelo Senado, sem necessidade de votação no plenário da
Câmara.
Em
seu texto, foi incluída a vedação a qualquer “ação de natureza disciplinar com
uso da força física que resulte em sofrimento físico ou lesão à criança ou
adolescente”.
Custa-me crer que uma criança saia
de sua casa em busca de uma delegacia de polícia para denunciar um puxão de
orelha ou um tapa na bunda que sofreu de seus próprios pais por ter se recusado
a tomar banho ou fazer a tarefa da escola. E mesmo que isso aconteça, vai lá a
autoridade policial autuar em flagrante os pais ? O Poder Judiciário vai
condená-los e tirar-lhe o poder familiar para colocar o filho “agredido” numa casa de
apoio ? O Estado encaminhará os pais para um curso de orientação ou atendimento
psicológico e psiquiátrico? Sinceramente, creio que não.
A lei a ser aprovada prevê o
“direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de
castigos físicos ou de tratamento cruel e degradante.” Ora, tratamento cruel e
degradante já é crime considerado e punido por legislação pretérita. Até aqui estamos chovendo no molhado. Resta-nos então os “castigos”.
Mas afinal, de que “castigos”
estamos falando? historicamente, e fruto de um condicionante educacional, se
sabe que os corretivos (palmadas, beliscões...) vêm, ao longo dos anos,
diminuindo de geração para geração seja na família e até mesmo na escola, com a
aposentadoria da palmatória. E nesse particular, eu mesmo posso dizer que fui
muito mais corrigido do que corrigi, sem, no entanto, trazer ou transmitir
qualquer trauma do velho cipó de fedegoso de D. Mariinha que me mostrou, com
maestria, o caminho do bem.
Contudo, há de se dizer que se os
“corretivos” de pai para filho vêm diminuindo, o mesmo não vem acontecendo com
a escalada de violência incrustada na nossa sociedade em todas as classes
sociais. Diariamente assistimos uma geração de “sem limites” transgredir em
casa, no trânsito, na família, na escola, na rua.
Obviamente, que fique claro que
não defendo a prática de desmedida violência contra crianças, e, repita-se,
isso já é crime punível pelo Código Penal brasileiro. Entretanto, considero
extravagante e desproporcional uma lei que tenha por escopo subtrair da família
o direito subjetivo de escolher como melhor educar seus filhos.
O que se vê é que na sociedade
moderna já há uma clara indefinição dos pais quanto a estabelecer diretrizes,
deveres, obrigações e limites aos filhos num mundo cada vez mais midiático e
sem freios que entra em nossos lares sem pedir licença pela TV e Internet,
dentre outros tantos meios de comunicação. Essa falta de referência familiar
vem se refletindo em violência na rua e na escola, no desrespeito aos
professores, vitimas imediatas desse aparente descontrole.
Por
outro lado, falta ao Estado o aparato necessário para dar suporte às ações
pretendidas pela nova lei. Se, até hoje, não tem o Poder Público condições
estruturais de promover às medidas necessárias a recuperação e ressocialização
de agentes delituosos mais graves, obviamente que, igualmente, não cumprirá
efetivamente com a observância das medidas mais simples, sejam educativas, corretivas ou
ideológicas abraçadas pela “Lei da Palmada”.
Educar os filhos é algo que passa
pela subjetividade dos pais no estabelecimento do respeito e dos limites e até
da cultura das famílias. São aspectos que variam muito, de região para região,
de uma família para outra e não há um catálogo ou um ranking a ser seguido ou perseguido pelos pais ou responsáveis.
Cabe à família sopesar de forma
respeitosa e proporcional suas ações enquanto célula formadora da sociedade, e
não me parece apropriado que o legislador insira a possibilidade de basilamento
e de incriminação dos pais, punindo-os com o rigor da lei, em suas tentativas
de melhor “aprumar” seus filhos.
A propósito, outro dia, lendo um
livro de um renomado pediatra paulista, já falecido, e que infelizmente agora
não me surge o nome, chamou-me a atenção a frase por ele utilizada para
defender a subjetividade da família em encontrar seus caminhos e sua forma de
educar os filhos, dizia ele em tom quase profético – “não é a toa que a mão e côncava e o bumbum é convexo”.
De tudo, o que dessume-se, é que
o projeto é fruto da cabeça pensante de nossos representantes legislativos.
Deputados e Senadores “traquinos”, que ao meu sentir, a despeito de suas ações
com a coisa pública, em sua maioria, não foram muito bem educados quando
criança.
A “Lei menino Bernardo”, a meu
juízo, é mais uma norma que nasce morta.
Merecedora de urgentes corretivos, nem que seja alguns puxões de orelha.
Teófilo
Júnior
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