(ilustração para Viagem ao Centro da Terra)
Há um episódio na Viagem ao Centro da Terra de Julio Verne que me pareceu enigmático quando o li pela primeira vez aos 12 anos.
Neste livro, o Prof. Lidenbrock e seu sobrinho Axel encontram um velho pergaminho onde está indicada uma passagem para o centro da Terra, através de um vulcão extinto na Islândia. Os dois empreendem a viagem, no capítulo 8 passam por Copenhague, e ao passear pela cidade o Professor percebe o campanário da igreja de Vor-Frelsers-Kirk. Resolvem subir até o alto.
Primeiro sobem uma escada em caracol interna, depois passam para outra escada análoga, que sobe em espiral pelo lado de fora da torre. (Há um belo simbolismo oculto nesta espiral que parte do interior para o exterior, rumo ao alto.)
Chegando lá em cima, Axel está apavorado, tomado pela sensação de vertigem:
“Abri os olhos. Entrevi por entre o fumo das chaminés as casas deprimidas, como se tivessem ficado esmagadas numa queda. Por cima de nós perpassavam nuvens desgrenhadas, e, pelo efeito de ilusão óptica, pareciam-me imóveis, enquanto o campanário e nós corríamos com vertiginosa rapidez.”
Verne nunca foi um bom prosador ou estilista, mas tinha, como poucos escritores, a intuição da imagem forte, inesperada, misteriosamente inesquecível. Esta torre imóvel que parece ser arrebatada a toda velocidade através do espaço é uma das imagens mais fortes do livro; e ele a complementa fazendo o Prof. Lidenbrock dizer a Axel:
“Olha, mas olha bem! É necessário tomar lições de abismo!”.
Sempre achei fascinante que um indivíduo que se prepara para mergulhar nas entranhas da terra achasse necessário, como estágio preparatório, subir ao cimo de uma torre altíssima. Há nisso um simbolismo psicológico (subir às alturas é um modo de mergulhar nas profundezas do Inconsciente), mas há também um dos traços que fizeram de Julio Verne o autor de obras fundadoras, obras que alteraram nossa relação física e mental com o mundo.
Num artigo de 1906, Anatole Le Braz dizia:
“Verne nos trouxe a poesia do espaço, o frêmito do infinito. Comparemos o mundo sem limites a que ele nos conduz com o mundo que nos é pintado pelos romances habituais. No romance moderno predomina o ar da sala-de-visitas, do quarto, da alcova; é um ar abafado. No romance de Verne, é o ar livre, o ar virgem, o ar que nunca foi respirado. Quando o lemos, sentimos passar através dos nossos pulmões grandes sopros de ar que vêm das profundezas do ilimitado.”
Grande parte da rejeição que algumas pessoas têm à ficção científica deve-se a isto. Há pessoas (e nada tenho contra elas, entendo perfeitamente) que só se sentem à vontade no interior de um ambiente que conhecem, que controlam. Essas pessoas não têm o senso da aventura, nem mesmo sentadas em sua poltrona de leitura.
A ficção científica nos arrebata para outros espaços, outros tempos, e essas pessoas sofrem de vertigem. Uma vertigem conceitual, que as faz recuar diante das lições de abismo.
Neste livro, o Prof. Lidenbrock e seu sobrinho Axel encontram um velho pergaminho onde está indicada uma passagem para o centro da Terra, através de um vulcão extinto na Islândia. Os dois empreendem a viagem, no capítulo 8 passam por Copenhague, e ao passear pela cidade o Professor percebe o campanário da igreja de Vor-Frelsers-Kirk. Resolvem subir até o alto.
Primeiro sobem uma escada em caracol interna, depois passam para outra escada análoga, que sobe em espiral pelo lado de fora da torre. (Há um belo simbolismo oculto nesta espiral que parte do interior para o exterior, rumo ao alto.)
Chegando lá em cima, Axel está apavorado, tomado pela sensação de vertigem:
“Abri os olhos. Entrevi por entre o fumo das chaminés as casas deprimidas, como se tivessem ficado esmagadas numa queda. Por cima de nós perpassavam nuvens desgrenhadas, e, pelo efeito de ilusão óptica, pareciam-me imóveis, enquanto o campanário e nós corríamos com vertiginosa rapidez.”
Verne nunca foi um bom prosador ou estilista, mas tinha, como poucos escritores, a intuição da imagem forte, inesperada, misteriosamente inesquecível. Esta torre imóvel que parece ser arrebatada a toda velocidade através do espaço é uma das imagens mais fortes do livro; e ele a complementa fazendo o Prof. Lidenbrock dizer a Axel:
“Olha, mas olha bem! É necessário tomar lições de abismo!”.
Sempre achei fascinante que um indivíduo que se prepara para mergulhar nas entranhas da terra achasse necessário, como estágio preparatório, subir ao cimo de uma torre altíssima. Há nisso um simbolismo psicológico (subir às alturas é um modo de mergulhar nas profundezas do Inconsciente), mas há também um dos traços que fizeram de Julio Verne o autor de obras fundadoras, obras que alteraram nossa relação física e mental com o mundo.
Num artigo de 1906, Anatole Le Braz dizia:
“Verne nos trouxe a poesia do espaço, o frêmito do infinito. Comparemos o mundo sem limites a que ele nos conduz com o mundo que nos é pintado pelos romances habituais. No romance moderno predomina o ar da sala-de-visitas, do quarto, da alcova; é um ar abafado. No romance de Verne, é o ar livre, o ar virgem, o ar que nunca foi respirado. Quando o lemos, sentimos passar através dos nossos pulmões grandes sopros de ar que vêm das profundezas do ilimitado.”
Grande parte da rejeição que algumas pessoas têm à ficção científica deve-se a isto. Há pessoas (e nada tenho contra elas, entendo perfeitamente) que só se sentem à vontade no interior de um ambiente que conhecem, que controlam. Essas pessoas não têm o senso da aventura, nem mesmo sentadas em sua poltrona de leitura.
A ficção científica nos arrebata para outros espaços, outros tempos, e essas pessoas sofrem de vertigem. Uma vertigem conceitual, que as faz recuar diante das lições de abismo.
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo
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