sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Entrevista: Pe. Ernaldo José de Sousa


A igreja Católica tem sempre a preocupação de não separar Fé e Vida, Vida e Fé. Todo cristão deve ser politizado, embora que nem todo político seja cristão”.


Pároco da igreja matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Pombal-PB, Pe. Ernaldo José de Sousa recebeu em seu gabinete o nosso Blog e concedeu a seguinte entrevista:

Blog - O papado de João Paulo II se notabilizou pela sua atuação peregrina e política. Além de ser um grande comunicador ele contribuiu para o fim do comunismo na Europa Oriental. O que marcará o papado de Bento XVI ?

Pe. Ernaldo - A continuidade do projeto da Igreja confiado ao Papa João Paulo Segundo no seu Papado. O Papel da continuidade é bem lógico, visto que Joseph Ratzinger era muito próximo de seu antecessor pelo cargo que exercia como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.

A inteligência prática e objetiva já é um marco no Papado atual. Recordo segundo reportagem de uma agência de televisão Italiana que fazia referência ao novo Papa como “o homem mais inteligente do mundo”.

Reforma interna da igreja especialmente se tratando da caminhada do magistério para responder aos desafios atuais e conseqüentemente futuros do mundo pedindo resposta à igreja.

Blog – Teoricamente, o papado de Joseph Ratzinger, hoje com mais de 80 anos, será um pontificado mais curto. Haverá tempo para os católicos diferenciarem os dois papados ou este será apenas a continuação do seu antecessor ?

Pe. Ernaldo - Por mais que um papa seja semelhante ao outro no tocante a um papado para outro como o atual, não se pode ignorar que cada papa tem sua tônica histórica pessoal que é inconfundível com a anterior, e até porque ninguém é igual a ninguém.

No caso de uma continuidade como se comenta atualmente, deve-se a missão da igreja acontecendo através dos instrumentos confiados pela providencia (Deus), não é por acaso que a igreja Católica se identifica pelas quatro Notas que a fez, que a faz e que sempre fará: Una, Santa, Católica e Apostólica.

Blog – O casamento entre homossexuais já é legalizado em países como a Inglaterra, a Holanda e a Espanha. Na África do Sul se registra o maior índice de pessoas infectadas com o vírus da AIDS. Nos Estados Unidos padres e bispos se envolveram em casos de pedofilia. Terapias já são realizadas com células tronco e cientistas estão a caminho de uma possível clonagem humana. No inicio deste século qual a temática que mais aflige a igreja?

Pe. Ernaldo - Primeiro na linguagem Cristã Bíblia e a luz da lei natural não há casamento entre pessoas do mesmo sexo. O que aconteceu ou vem acontecendo nos países citados é a legalização de união civil entre parceiros ou parceiras do mesmo sexo. O mundo secular ou secularizado ignora ou tenta ignorar a diferença profunda entre o Sacramento do Matrimônio, a União Civil entre o homem e a mulher e a União Civil entre pessoas do mesmo sexo, que não se pode chamar de casamento, pois não condiz sequer ao sentido verdadeiro da palavra casamento, que quer dizer se locupletar na perspectiva da perpetuação da espécie humana.

O que mais preocupa a igreja católica segundo o papa é a ditadura do relativismo, que coloca em risco a vida até de indefesos ainda na vida intra uterina (o aborto). É verdade que a biotecnologia vem fazendo grande bem a humanidade como, por exemplo, a descoberta das células tronco adultas, que vem ajudando em tratamentos terapêuticos. O que preocupa a igreja vitalmente é a manipulação da vida, negando o que temos de mais sagrado, que é o direito do nascituro. Isso se tratando dos experimentos com células tronco-embrionárias. Alem disso é bom lembrar que tais benefícios da biotecnologia atingem apenas uma pequena elite da sociedade, não negamos a importância dessas descobertas, mas é importante que não esqueçamos que enquanto os governos investem bilhões de dólares em pesquisas desse tipo, mais de 1 bilhão de pessoas passam fome pelo mundo afora.

Uma questão ainda preocupante é o ingresso de rapazes nos seminários e conventos sem a condição devida para a vida consagrada, no tocante ao Celibato.

Blog – Vivemos hoje em um mundo globalizado, com intenso reflexo na economia, na cultura e na comunicação. O Catolicismo se adequou a essa evolução de que forma?

Pe. Ernaldo - Basta que nos reportemos à doutrina social da igreja fundamentada desde os primeiros Cristãos (atos 4:32-37), a patrística (os primeiros padres da Igreja), sem ignorar o Vaticano II, João XXIII reronovarum (renovação das coisas). O episcopado brasileiro se encontra anualmente para avaliar a caminhada da igreja no Brasil, a exemplo disso, temos os documentos do ano passado onde os bispos apresentaram o documento 80 abordando o tema profetismo, missão da igreja e a exclusão social, dando enfoque também a questões polêmicas como o aborto e a pesquisa de células tronco embrionárias. Lembrando que a igreja Católica tem sempre a preocupação de não separar Fé e Vida, Vida e Fé, e que todo cristão deve ser politizado, embora que nem todo político seja cristão.

Blog – O islamismo atualmente é a religião que mais cresce em todo o mundo. O catolicismo no Brasil vem perdendo fiéis enquanto cresce o número de novas denominações religiosas. Por que isso acontece ?

Pe. Ernaldo - No caso do Brasil há muita gente sem assistência personalizada ou individual em virtude de poucos padres para muita gente, mesmo muitos leigos assumindo lideranças seguras e convictas ainda deixamos muitas pessoas a mercê do proselitismo que com falsas promessas pregam uma religião da fácil e “falsa” prosperidade, com algumas exceções. Uma causa evidente é que muitos católicos vivem ainda uma mentalidade de regime de cristandade, isto é, procuram a Deus somente em situações ímpares como festa do padroeiro, casamentos, batizados, quando morre algum conhecido, etc. Quando na verdade ser cristão é ser Igreja a partir das palavras de Jesus “quem quiser ser meu discípulo tome sua cruz e siga-me”.

Blog – Anos atrás o jornal dinamarquês Jyllands-Posten e o francês France Soir publicaram piadas com a ilustração da charge de Maomé. A reação do Islã foi imediata e violenta trazendo novamente à tona pontos de ruptura cultural e religiosa entre o Ocidente e o Oriente. De um lado, a defesa da “liberdade de expressão”, de outro, a exigência da punição dos autores da “blasfêmia”. Qual a sua posição a respeito desta questão ?

Pe. Ernaldo - Como se sabe o Islamismo tem uma história ímpar no mundo, basta que recordemos o que aconteceu no passado e que ainda reflete no presente. Sabendo disso, é preciso que cada povo seja tratado conforme o seu perfil existencial, a quem diga que a Dinamarca tendo uma boa relação com os norte-americanos; uma brincadeira dessa natureza é interpretada como uma questão estratégica ou política. Sabe-se que muitos brincam com o Papa ou outras personalidades importantes, mas devemos acima de tudo respeitar a singularidade de cada povo e em especial os mulçumanos que ainda vivem os reflexos de um passado ferido. O fato é que existem mulçumanos fundamentalistas, mas também existem outros mais abertos ao diálogo e isso não nos da o direito de relativisar ou suavisar.

Blog - Muito obrigado pela entrevista.
Nota: A presente entrevista foi publicada anteriormente no nosso extinto site "o mundo das palavras".

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