O físico John N. Bahcall disse certa vez: “As descobertas
mais importantes trazem respostas para perguntas que ainda não tínhamos condições
de formular, e dizem respeito a objetos que não tínhamos como imaginar até
então”. Parece irônico, mas na Ciência a gente muitas vezes encontra a resposta
antes de ter uma pergunta para ela. Quando Einstein propôs sua Teoria Especial
da Relatividade, em 1905, faltava-lhe uma formulação matemática adequada
(consta que ele não era um grande matemático; suas descobertas eram mais
intuitivas do que formais). Então seu ex-professor Hermann Minkowski mostrou
que esse arrazoado matemático já existia, independentemente das descobertas no
campo da Física. Era, de certo modo, um raciocínio já pronto e clarificado, só
que não tinha aplicação prática. Era uma resposta em busca de uma pergunta –
que foi fornecida pela Física.
O trabalho criador do cientista (porque um cientista faz
outros trabalhos que não são criadores) parece muito com o do artista; ele
avança meio cegamente, guiado pela imaginação, associação de ideias, intuição,
palpite, obsessão maníaca, o que for. Vai descobrindo coisas que não sabe o que
são. Uma das melhores descrições desse impulso
criador coletivo é de Nietzsche em A Gaia Ciência (1882; trad. Paulo César de Souza):
“Então
vocês acham que as ciências teriam surgido e progredido, se os feiticeiros,
alquimistas, astrólogos e bruxas não as tivessem precedido, como aqueles que
tinham antes de criar, com suas promessas e miragens, sede, fome e gosto por
potências escondidas e proibidas? Não
veem que foi preciso prometer
infinitamente mais do que era possível realizar, para que algo se realizasse no
âmbito do conhecimento? – Talvez, da mesma forma como nos aparecem hoje os prelúdios
e exercícios prévios da ciência, que não
foram praticados e percebidos como tais, também a religião inteira se apresente como exercício e prelúdio para alguma
época distante: ela poderá ter sido o meio singular de alguns indivíduos
poderem fruir toda a autossuficiência de um deus e toda sua força de
autorredenção. Sim – é lícito perguntar --, teria o ser humano aprendido, sem a
escola e pré-história da religião, a sentir fome e sede de si e encontrar saciedade e plenitude em si? Foi preciso que Prometeu imaginasse
antes haver roubado a luz e pagasse por isso – para finalmente descobrir que
havia criado a luz, ao ansiar por ela,
e que não apenas o ser humano, mas também a divindade
fora obra de suas mãos e argila em suas mãos? Tudo apenas imagens do formador
de imagens? -- assim como a ilusão, o
furto, o Cáucaso, o abutre e toda a trágica Prometeia
dos homens do conhecimento?”
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo
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