As grandes batalhas cósmicas nos romances de Fantasia eram
batalhas morais entre o Bem e o Mal.
Variam os sistemas éticos, mas a guerra é essa.
Aqui, torna-se mais claro um equívoco que
muitos moralistas, muitos autores e muitos leitores praticavam, e ainda
praticam. Dizem eles que a luta do
Cosmos é para o Bem destruir o Mal.
Está errado. O Mal faz parte da
estrutura atômica e molecular do Bem. Deve se submeter ao Bem, e não a si
próprio.
O Bem não precisa destruir o
Mal, aliás nenhum dos dois pode destruir o outro. Eles têm um equilíbrio como o de cavaleiro e cavalo. O Bem doma o
Mal.
Já outras fantasias mostram a batalha entre a Ordem e o
Caos. Um trecho do Universo onde exista apenas Ordem (se isso é fisicamente
possível!) é um espaço morto, e onde houver apenas Caos, idem idem.
O mundo é um equilíbrio dinâmico constante
entre milhões de sistemas físicos, químicos, biológicos, psicológicos, sociais,
econômicos, etc., interagindo, competindo, cooperando e se influenciando sem
parar. Um sistema estagnado, onde nada
acontece, precisa de uma injeção de Caos para voltar à vida. Um sistema totalmente aleatório, browniano,
precisa produzir padrões de estabilidade e de Ordem, para se alimentar deles,
captar sua energia, e reinvesti-la de novo.
É assim que as formas físicas crescem.
O Senhor dos Anéis é um misto dos dois. Uma história cheia
de discussões morais, claro, onde J. R. R. Tolkien, embora não faça uma
alegoria religiosa tão explícita quanto a que seu amigo C. S. Lewis fez na
série Crônicas de Narnia, conta uma história de fundo moral.
Tolkien dá a ela
um interessante volteio narrativo: para destruir o símbolo do Mal, é preciso ir
de encontro ao Mal, ir à borda do motor ígneo de sua energia, seu núcleo
radioativo, a montanha-vulcão de Mordor.
É preciso ir ao coração das trevas.
Essa luta é também uma luta entre a Ordem e o Caos. De
posse do Anel de Poder, Sauron, o Homogêneo, transformará o Universo num
“continuum” indiferenciado multidimensional com um buraco-negro no centro. Ele
e seu Anel sugarão todo o Poder para esse centro-vórtice onde tudo colapsa em
ausência, estendendo atrás de si um manto de entropia exponencialmente maior.
O
Mal é uma monocultura hegemônica. O Bem é feito de pequenas coisas sem
objetivos maiores e com necessidades específicas. Hobbits, anões, ents,
humanos, elfos, gigantes, cavalos, elefantes, árvores, frutas, as águas dos
rios e assim por diante.
O Bem é a
cosmodiversidade. O Mal (Sauron) parece desejar uma Singularidade de pixels
cinzentos, parece desejar uma Ordem superior, mas acaba criando o Caos por
superconcentração.
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo