São estas, sem dúvida alguma, as recordações da minha infância e adolescência, misturadas numa intrincada madeixa com uma infinidade de interpretações de que nem sequer estou consciente. Às vezes, penso que levantar a pesada tampa que me separa da cloaca e ressuscitar as dores do passado não me serve para nada, exceto para reforçar a sensação de desassossego que me trouxe até ao seu consultório. Também me pergunto se o seu silêncio não fomentou a incerteza em que agora me encontro. Às vezes, dá-me para duvidar de toda esta história, como se em vez de uma vivência se tratasse de um relato que repeti a mim mesma uma infinidade de vezes. Quando penso assim, a sensação de desorientação torna-se abismal e hipnótica, uma espécie de precipício existencial a convidar-me a dar um salto definitivo.»
[Guadalupe Nettel, O corpo em que nasci; em tradução para a Teodolito]
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