quarta-feira, 31 de julho de 2019
Versículos do dia
Eu, porém, olharei para o Senhor; esperarei no Deus da minha salvação; o meu Deus me ouvirá.
E
a esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado
em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.
terça-feira, 30 de julho de 2019
"Saber tratar de coisas externas sem perder a concentração interna, ser
místico por dentro e ser ativo por fora; possuir toda a sabedoria
intuitiva sem se derramar pela ciência analítica; poder ser intensamente
produtivo sem nada reter para si; poder agir sem se perder na
atividade; poder guiar outros sem os constranger - quem isso pode fazer é
um sábio".
( Huberto Rohden in "Tao Te Ching")
Ás parcas
Dai-me, Potestades, mais um verão apenas,
Apenas um outono de maduro canto,
Que de bom grado, o coração já farto
Do suave jogo, morrerei então.
A alma que em vida nunca desfrutou os seus
Direitos divinos nem no Orco acha repouso;
Mas se eu lograr o que é sagrado, o que
Trago em meu coração, a Poesia,
Serás bem-vinda então, paz do mundo das sombras!
Contente ficarei, mesmo que a minha lira
Não leve comigo; uma vez, ao menos,
Vivi como os deuses, e é quanto basta.
Friedrich Holderlin
Apenas um outono de maduro canto,
Que de bom grado, o coração já farto
Do suave jogo, morrerei então.
A alma que em vida nunca desfrutou os seus
Direitos divinos nem no Orco acha repouso;
Mas se eu lograr o que é sagrado, o que
Trago em meu coração, a Poesia,
Serás bem-vinda então, paz do mundo das sombras!
Contente ficarei, mesmo que a minha lira
Não leve comigo; uma vez, ao menos,
Vivi como os deuses, e é quanto basta.
Friedrich Holderlin
segunda-feira, 29 de julho de 2019
Frase
Nada mais frágil que as amizades humanas; levam muitos anos a formarem-se e um momento só as desfaz.
Versículos do dia
Mas desejamos que cada um de vós mostre o mesmo cuidado até ao fim, para completa certeza da esperança;
domingo, 28 de julho de 2019
De volta ao passado
Não nasci na roça, o que lamento muito, mas posso dizer que tive uma infância predominantemente rural. Meu avô materno, Ariamiro, tinha um sitio pequeno e pertinho da cidade onde pude viver intensamente aquele mundo sem internet, televisão ou luz elétrica. O Vô Miro era um homem de poucas palavras. Uma das coisas que adorava fazer com ele era acompanhá-lo cedinho, do alto dos meus oito anos, até a roça colher e comer melancia tirada da rama, ali mesmo, no roçado, molhada pelo sereno da madrugada.
Hoje, 42 anos depois, senti essa inevitável saudade. Vontade de novamente sentir o cheiro da terra, de comer melancia no meio da roça... enfim, essas coisas simples que marcam para sempre a vida de qualquer criança.
Pois bem, resolvi que faria isso de novo. Como sempre, procurei o amigo Zé Preá (personagem do meu livro) e convidei o amigo Paulo para essa aventura de outrora. Foi uma delícia reviver tudo de novo e atestar, alegre e sobejamente, que a verdadeira felicidade está nas coisas mais simples da vida!
Zé PreáO senhor da noite
Toca sanfona em
praça pública e sempre consegue mais do que precisa para o quarto
de pensão e o pê-efe. O dinheiro que sobra ele aplica na
Raspinha. Já ganhou duas vezes. Sem saber até hoje, o vendedor bem
quieto ficou com o prêmio.
— Roubando cego, hein! - disse um bêbado que percebeu a malandragem.
Os olhos são duas caçapas de mesa de sinuca, lacradas por uma courama murcha.
Em Peabiru, foi sanfoneiro de zona. Trabalhava de noite e cochilava de dia no quarto das mulheres. Os gigolôs nem se incomodavam com a presença de um morcego.
Em Curitiba, continua sua vida noturna sob o sol. Das nove às vinte horas pode ser encontrado no calçadão da Rua XV, nunca no mesmo lugar. Pula de um canto para outro do tabuleiro este que é o senhor da noite.
Sapo é seu fiel empresário. Cuida para que ninguém roube as gorjetas. Vigia a sanfona e o banquinho enquanto Tome sai para o almoço ou para jogar. Olhos vermelhos de bebida, Sapo recebe indiferente o sanduíche de pão com vina e a garrafinha de refri. No final do dia fica com 20% dos lucros, que ele contabiliza errado, roubando o que pode. Com o que consegue indevidamente, à noite se embebeda.
Agora o Tomé vai pro restaurante, tateando o chão com a bengala. Os meninos que catam papel, ao vê-lo, gritam por pura diversão.
— Pega!
— Isso mesmo, vamos pegar o dinheiro do Tomé.
— Está no bolso da calça.
— Aproveita que ninguém tá vendo.
— Agora!
Em pânico, ele fica parado, atrapalhando as pessoas que passam. Encolhe-se todo, as mãos protegendo o bolso, e chora em silêncio, na sua solidão de cego.
As lágrimas escorrem para dentro.
— Roubando cego, hein! - disse um bêbado que percebeu a malandragem.
Os olhos são duas caçapas de mesa de sinuca, lacradas por uma courama murcha.
Em Peabiru, foi sanfoneiro de zona. Trabalhava de noite e cochilava de dia no quarto das mulheres. Os gigolôs nem se incomodavam com a presença de um morcego.
Em Curitiba, continua sua vida noturna sob o sol. Das nove às vinte horas pode ser encontrado no calçadão da Rua XV, nunca no mesmo lugar. Pula de um canto para outro do tabuleiro este que é o senhor da noite.
Sapo é seu fiel empresário. Cuida para que ninguém roube as gorjetas. Vigia a sanfona e o banquinho enquanto Tome sai para o almoço ou para jogar. Olhos vermelhos de bebida, Sapo recebe indiferente o sanduíche de pão com vina e a garrafinha de refri. No final do dia fica com 20% dos lucros, que ele contabiliza errado, roubando o que pode. Com o que consegue indevidamente, à noite se embebeda.
Agora o Tomé vai pro restaurante, tateando o chão com a bengala. Os meninos que catam papel, ao vê-lo, gritam por pura diversão.
— Pega!
— Isso mesmo, vamos pegar o dinheiro do Tomé.
— Está no bolso da calça.
— Aproveita que ninguém tá vendo.
— Agora!
Em pânico, ele fica parado, atrapalhando as pessoas que passam. Encolhe-se todo, as mãos protegendo o bolso, e chora em silêncio, na sua solidão de cego.
As lágrimas escorrem para dentro.
Miguel Sanches Neto
O primeiro dia
O que o acordou foi o silêncio. Primeiro, o do despertador que não tocou à hora
combinada todas as manhãs. Depois, o de outra respiração, que devia ouvir e não ouvia.
Estendeu a mão para o quente do outro lado da cama e encontrou o frio. Apalpou e
encontrou vazio. Então, sim, despertou completamente.
Um prenúncio de tragédia desceu por ele abaixo, como um arrepio. O que acabara de se lembrar era que não acordara só por acaso ou por acidente: aquele era o primeiro dia, a primeira manhã da sua separação — o primeiro de quantos dias? — em que acordaria sempre sozinho, com metade da cama fria, metade do ar por respirar.
Era Abril, sábado e chovia. Sentado na cama, lembrou-se das instruções que dera a si mesmo para aquela manhã: fazer peito forte à desgraça. Nada é inteiramente bom, mas nada é inteiramente mau - pensou. Posso ler à noite até me apetecer sem me mandarem apagar a luz, posso dormir atravessado na cama, posso-me livrar daquele rol de cobertores com o qual ela me esmagava, fizesse sol, chuva ou frio, porque as mulheres são mais friorentas que eu sei lá, posso usar a casa-de-banho todo o tempo que quiser, posso espalhar as roupas, os jornais e os papéis pelo quarto à vontade e até - oh, suprema liberdade — posso fumar à noite na cama.
Levantou-se para se olhar ao espelho da casa-de-banho. Sorriu à sua própria imagem, ensaiou-a calma, tranquila, confiante. Imaginou mentalmente o texto que poderia redigir sobre si mesmo para a secção de anúncios pessoais do jornal: “Divorciado, 40 anos, bom aspecto, licenciado, rendimento médio-alto, casa própria e espaçosa, desportos, ar livre, terno e com sentido de humor”. Mulheres compatíveis? Deus do céu, dezenas delas! Sou um partidão — concluiu para o espelho.
Calmo, tranquilo e confiante, passou aos outros aposentos da casa para dar uma vista de olhos ao resultado da partilha dos móveis, aliás feita sem grandes problemas, como é próprio de gente civilizada. Por alto, entre o living, o hall, o escritório, a cozinha, o quarto de casal e as duas casas-de-banho, estimou nuns setecentos contos o preço da reposição das coisas em falta. Mais metade dos livros e dos CD's, quase todas as fotografias dos últimos dez anos das suas vidas e algumas outras coisas cujo verdadeiro valor era o vazio que encontrava se olhasse para o lugar onde elas costumavam estar.
“Até agora vou-me aguentando”, considerou ele. Entre perdas e danos e a certeza adquirida de que nada dura para sempre, restavam-lhe várias razões e objectos e sentimentos para olhar em frente sem um sobressalto.
Enquanto fazia, com um prazer insuspeitado, o seu primeiro pequeno-almoço de homem só, passou à fase seguinte do que chamara o “plano de sobrevivência”: desfolhar a agenda de telefones em busca de amigos igualmente sós com quem fazer “programas de homens” ou de antigas namoradas, que se tinham separado ultimamente ou outras que achava acessíveis mas que nunca tivera a coragem e a oportunidade de aproximar. A primeira desilusão foi com os amigos: de A a Z, realizou que só tinha dois amigos sem mulher e, para agravar as coisas, com nenhum deles lhe apetecia sair e entrar numa de “anda daí e mostra-me lá como é o mundo lá fora”. Quanto às mulheres que julgava sortables, sempre eram cinco, mas o resultado foi quase patético. Duas já não moravam naqueles telefones, outra tinha-se casado entretanto, e o marido estava ao lado a ouvir a conversa, o que o deixou completamente idiota a inventar pretextos absurdos para o telefonema. Do número da quarta atendeu uma criancinha e ele desligou e foi só na última da lista que finalmente teve sorte: sim, a Joana morava ali, era ela própria ao telefone. Não, não estava casada nem, pelo que, esforçadamente, percebeu, tinha namorado. Sim, ok, por que não irem jantar logo, para falar do projecto que ele tinha e onde ela poderia caber. “Ah, a tua mulher não vem? Separados? Não, não sabia. Recente? Pois, essas coisas são tão chatas, mas ainda bem que reages e tens projectos novos e tudo! Ok, às oito e meia vens-me buscar”. Ele teria desligado quase em êxtase, não fosse a frase final dela, à despedida, que o deixou verdadeiramente abalado. “Olha, vais-me achar uma grande diferença. A idade não perdoa a ninguém, não é?”
Enfim, sempre era um date. O primeiro, certamente, de uma longa lista. O que interessa se for um flop — achas que ias encontrar uma mulher super logo ao virar da esquina? É preciso é entrar no circuito, pá, começar a sair, a ser visto, fazer com que as pessoas saibam que estás disponível. O resto vem por arrasto.
Passeou-se pela casa, pensativo, fumando o primeiro cigarro do dia. De repente lembrou-se que ainda não tinha visto o quarto do filho. A cama e a escrivaninha tinham ido, assim como praticamente todos os brinquedos. Sobrava um boneco de peluche, três ou quatro carrinhos semi-partidos, uns legos e um quadro para fazer desenhos, com os respectivos marcadores, pousados, à espera de uma mão de criança. A mesa-de-cabeceira ficara e parecia absurda no meio do quarto, sem a cama nem os outros móveis, com um retrato dele e do filho numa praia do Algarve, sorrindo, abraçados um ao outro. Sem saber porquê, sentou-se no chão encostado à parede, muito devagar, a olhar para a fotografia. Duas grossas lágrimas escorregaram-lhe pela cara abaixo e caíram na madeira do chão, entre as pernas. Foi só então que ele percebeu que estava a chorar.
Um prenúncio de tragédia desceu por ele abaixo, como um arrepio. O que acabara de se lembrar era que não acordara só por acaso ou por acidente: aquele era o primeiro dia, a primeira manhã da sua separação — o primeiro de quantos dias? — em que acordaria sempre sozinho, com metade da cama fria, metade do ar por respirar.
Era Abril, sábado e chovia. Sentado na cama, lembrou-se das instruções que dera a si mesmo para aquela manhã: fazer peito forte à desgraça. Nada é inteiramente bom, mas nada é inteiramente mau - pensou. Posso ler à noite até me apetecer sem me mandarem apagar a luz, posso dormir atravessado na cama, posso-me livrar daquele rol de cobertores com o qual ela me esmagava, fizesse sol, chuva ou frio, porque as mulheres são mais friorentas que eu sei lá, posso usar a casa-de-banho todo o tempo que quiser, posso espalhar as roupas, os jornais e os papéis pelo quarto à vontade e até - oh, suprema liberdade — posso fumar à noite na cama.
Levantou-se para se olhar ao espelho da casa-de-banho. Sorriu à sua própria imagem, ensaiou-a calma, tranquila, confiante. Imaginou mentalmente o texto que poderia redigir sobre si mesmo para a secção de anúncios pessoais do jornal: “Divorciado, 40 anos, bom aspecto, licenciado, rendimento médio-alto, casa própria e espaçosa, desportos, ar livre, terno e com sentido de humor”. Mulheres compatíveis? Deus do céu, dezenas delas! Sou um partidão — concluiu para o espelho.
Calmo, tranquilo e confiante, passou aos outros aposentos da casa para dar uma vista de olhos ao resultado da partilha dos móveis, aliás feita sem grandes problemas, como é próprio de gente civilizada. Por alto, entre o living, o hall, o escritório, a cozinha, o quarto de casal e as duas casas-de-banho, estimou nuns setecentos contos o preço da reposição das coisas em falta. Mais metade dos livros e dos CD's, quase todas as fotografias dos últimos dez anos das suas vidas e algumas outras coisas cujo verdadeiro valor era o vazio que encontrava se olhasse para o lugar onde elas costumavam estar.
“Até agora vou-me aguentando”, considerou ele. Entre perdas e danos e a certeza adquirida de que nada dura para sempre, restavam-lhe várias razões e objectos e sentimentos para olhar em frente sem um sobressalto.
Enquanto fazia, com um prazer insuspeitado, o seu primeiro pequeno-almoço de homem só, passou à fase seguinte do que chamara o “plano de sobrevivência”: desfolhar a agenda de telefones em busca de amigos igualmente sós com quem fazer “programas de homens” ou de antigas namoradas, que se tinham separado ultimamente ou outras que achava acessíveis mas que nunca tivera a coragem e a oportunidade de aproximar. A primeira desilusão foi com os amigos: de A a Z, realizou que só tinha dois amigos sem mulher e, para agravar as coisas, com nenhum deles lhe apetecia sair e entrar numa de “anda daí e mostra-me lá como é o mundo lá fora”. Quanto às mulheres que julgava sortables, sempre eram cinco, mas o resultado foi quase patético. Duas já não moravam naqueles telefones, outra tinha-se casado entretanto, e o marido estava ao lado a ouvir a conversa, o que o deixou completamente idiota a inventar pretextos absurdos para o telefonema. Do número da quarta atendeu uma criancinha e ele desligou e foi só na última da lista que finalmente teve sorte: sim, a Joana morava ali, era ela própria ao telefone. Não, não estava casada nem, pelo que, esforçadamente, percebeu, tinha namorado. Sim, ok, por que não irem jantar logo, para falar do projecto que ele tinha e onde ela poderia caber. “Ah, a tua mulher não vem? Separados? Não, não sabia. Recente? Pois, essas coisas são tão chatas, mas ainda bem que reages e tens projectos novos e tudo! Ok, às oito e meia vens-me buscar”. Ele teria desligado quase em êxtase, não fosse a frase final dela, à despedida, que o deixou verdadeiramente abalado. “Olha, vais-me achar uma grande diferença. A idade não perdoa a ninguém, não é?”
Enfim, sempre era um date. O primeiro, certamente, de uma longa lista. O que interessa se for um flop — achas que ias encontrar uma mulher super logo ao virar da esquina? É preciso é entrar no circuito, pá, começar a sair, a ser visto, fazer com que as pessoas saibam que estás disponível. O resto vem por arrasto.
Passeou-se pela casa, pensativo, fumando o primeiro cigarro do dia. De repente lembrou-se que ainda não tinha visto o quarto do filho. A cama e a escrivaninha tinham ido, assim como praticamente todos os brinquedos. Sobrava um boneco de peluche, três ou quatro carrinhos semi-partidos, uns legos e um quadro para fazer desenhos, com os respectivos marcadores, pousados, à espera de uma mão de criança. A mesa-de-cabeceira ficara e parecia absurda no meio do quarto, sem a cama nem os outros móveis, com um retrato dele e do filho numa praia do Algarve, sorrindo, abraçados um ao outro. Sem saber porquê, sentou-se no chão encostado à parede, muito devagar, a olhar para a fotografia. Duas grossas lágrimas escorregaram-lhe pela cara abaixo e caíram na madeira do chão, entre as pernas. Foi só então que ele percebeu que estava a chorar.
(foi mantida a grafia original)
Miguel Sousa Tavares
Um solitário à espreita
Às
duas da manhã do primeiro dia do ano escutei num bar a conversa
de um casal. Não fui indiscreto: o par falava alto, era um papo para
ser ouvido. E olha que chovia uma chuva de canivete, com relâmpagos
e trovoadas. Pesquei a conversa no meio.
“Não
consulto oráculo nem sou cartomante”, ela riu. “Aliás, quem pode ser
adivinha...”
“Adivinha o quê?”, ele perguntou.
“Não te
pedi para adivinhar nada. Eu disse que não era uma adivinha.”
“Ah!”
“Só
espero que os prefeitos eleitos enterrem a praga nacional”, ela
disse.
“Qual
praga?”
“O
superfaturamento.”
“Das
obras?”
“De tudo, até da merenda escolar. São
capazes de super-faturar até a sopa para mendigos e desabrigados.”
“Mas
alguns políticos fazem isso”, ele disse.
“A sopa?
Superfaturamento da sopa? Como?”
“O
macarrão e a carne da sopa podem ser superfaturados. O óleo do
tempero e até o tempero...”
“Que
coisa horrorosa”, ela disse.
“O
problema não é a corrupção, que existe em todos os continentes.
Nosso problema é a...”
Relâmpagos com trovoadas.
“Não
ouvi o que você disse”, ela disse.
Uma trovoada mais forte interrompeu a
conversa. Os dois ficaram em silêncio, e eu, que já estava calado,
fiquei curioso para ouvir mais. Nós três esperamos o fim dos
trovões. Um homem tropeçou, derrubou uma cadeira e deu uma risada.
“Nosso
problema é a impunidade”, ele prosseguiu. “O judiciário... Uma parte
do judiciário é cúmplice de tudo isso. Os procuradores, a Polícia
Federal e alguns juízes são confiáveis, mas eles não podem tudo.”
“E
nós?”, ela perguntou.
“Nós?
Nós pagamos impostos. Somos cordeiros resignados no meio de milhões
de cordeiros sacrificados.”
“Mas você acha que é possível diminuir
a bandalheira? Por exemplo, uma redução de trinta por cento...
Seriam bilhões de reais investidos em habitação popular, hospitais.”
“Trinta por cento? Se a corrupção
diminuir tanto, o Brasil cresce oito por cento ao ano. Mas não sou
otimista: trinta por cento é a comissão das negociatas. Já foi dez,
passou para vinte, agora dizem que é trinta. Quando chegar a
cinquenta, será uma catástrofe...”
“Por isso meu avô apoiava os
militares.”
“Teu avô acreditava que o governo
militar era duro, mas honesto. E olha no que deu.”
“Acho que aquele sujeito bebeu muito”,
ela disse. “Vai mexer conosco. Vamos mudar de mesa? Aquela ali no
canto, perto do balcão...”
“Além disso, teu avô idolatrava a
censura. Ele dizia: ‘Mais vale um soneto de Camões ou uma receita de
bacalhau do que notícias subversivas’.”
“Coitado do vovô!”
“Coitado do país, isso sim.”
“Ele
gostava de você”, ela disse.
“Nem tanto”, ele protestou. “Uma vez
me ameaçou porque eu usava barba. Me chamou de terrorista. Você não
lembra?”
“Claro que lembro. E você disse na
cara dele: ‘O senhor apoia a tortura’.”
“O velho era um tremendo reaça...”
“Não vamos brigar por causa dele. Era
um homem bom, cheio de princípios.”
“Casei com urna ingênua”, ele disse.
“E eu com um comunista”, ela riu.
“Agora não há mais avô nem comunismo”,
ele disse. “Há burocracia, roubo e ganância. Impostos e juros altos
para sustentar políticos e burocratas. Mais uma cerveja? Você quer
mesmo ir para aquela mesa?”
“A chuva está passando. Quero ir pra
casa. O bar está vazio, só ficou esse bêbado”, ela disse.
“E aquele cara ali, que está ouvindo a
nossa conversa.”
“Um solitário”, ela disse.
“Um solitário... Mas por que você está
olhando para ele?”
“Não posso olhar para um homem sozinho
nas primeiras horas do Ano-Novo? Você está com ciúme?”
“Não. Não sei. Mas se você olhar
muito...”
“Queria saber o que ele pensa sobre a
corrupção.”
Os dois me olharam e eu olhei os pés
do bêbado. Na verdade, era um mendigo que se protegia da chuva.
Batia palmas e pedia uns trocados.
“Quem esse bêbado está aplaudindo?”,
ela perguntou.
“Nós”, ele disse. “Nossa conversa
sobre corrupção e impunidade. O impasse do Brasil.”
Ela se levantou: queria ir embora.
“Porque a gente fala, protesta e fica
indignado, mas só os bêbados escutam”, ele prosseguiu, deixando uma
cédula na mesa.
“Aquele cara escutou nossa conversa”,
disse a mulher
“Mas o que ele pode fazer? Nada. Vai
ver que é mais um bêbado solitário.”
“Será?”, ela perguntou, olhando para
mim e depois para as mãos do mendigo.
O homem, a luta e a eternidade
Adivinho nos planos da consciência
dois arcanjos lutando com esferas e pensamentos
mundo de planetas em fogo
vertigem
desequilíbrio de forças,
matéria em convulsão ardendo pra se definir.
Ó alma que não conhece todas as suas possibilidades,
o mundo ainda é pequeno pra te encher.
Abala as colunas da realidade,
desperta os ritmos que estão dormindo.
À guerra! Olha os arcanjos se esfacelando!
Um dia a morte devolverá meu corpo,
minha cabeça devolverá meus pensamentos ruins
meus olhos verão a luz da perfeição
e não haverá mais tempo.
Murilo Monteiro Mendes
dois arcanjos lutando com esferas e pensamentos
mundo de planetas em fogo
vertigem
desequilíbrio de forças,
matéria em convulsão ardendo pra se definir.
Ó alma que não conhece todas as suas possibilidades,
o mundo ainda é pequeno pra te encher.
Abala as colunas da realidade,
desperta os ritmos que estão dormindo.
À guerra! Olha os arcanjos se esfacelando!
Um dia a morte devolverá meu corpo,
minha cabeça devolverá meus pensamentos ruins
meus olhos verão a luz da perfeição
e não haverá mais tempo.
Murilo Monteiro Mendes
sábado, 27 de julho de 2019
Quem ama inventa
Quem ama inventa as coisas a que ama...
Talvez chegaste quando eu te sonhava.
Então de súbito acendeu-se a chama!
Era a brasa dormida que acordava...
E era um revôo sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressurreições...
Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente,
Ou sozinhos, num ritmo tristonho...
Ó! meu pobre, meu grande amor distante,
Nem sabes tu o bem que faz à gente
Haver sonhado... e ter vivido o sonho!
Mário Quintana
Talvez chegaste quando eu te sonhava.
Então de súbito acendeu-se a chama!
Era a brasa dormida que acordava...
E era um revôo sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressurreições...
Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente,
Ou sozinhos, num ritmo tristonho...
Ó! meu pobre, meu grande amor distante,
Nem sabes tu o bem que faz à gente
Haver sonhado... e ter vivido o sonho!
Mário Quintana
Nada pode saciar os apetites humanos,
pois a natureza nos deu a faculdade de tudo desejar, mas não nos deixa
senão provar poucas coisas, disto resultando um descontentamento
permanente, e um desgosto pelo que possuímos, o que nos faz culpar o
presente, louvar o passado e desejar o futuro, ainda que sem razão.
Versículos do dia
Porque eu quero a misericórdia, e não o sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que os holocaustos.
Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.
sexta-feira, 26 de julho de 2019
quarta-feira, 24 de julho de 2019
Veja as 10 piores empresas de João Pessoa; OI, Energisa e Cagepa lideram reclamações
As empresas campeãs de reclamação no SAC da Secretaria Municipal de
Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-JP) no primeiro semestre de 2019
são as prestadoras de serviços para telefonia, luz, água e bancos. Juntas, as empresas somam mais de 39% do total das reclamações, que este ano já somam 6.573 queixas registradas.
A empresa de telefonia Oi lidera o ranking com 653 reclamações (9,93% do total) nos seis primeiros meses deste ano. Pela ordem decrescente, as empresas mais demandadas de janeiro a junho de 2019 após a Oi foram Energisa, Cagepa, Tim Nordeste, Claro S.A, Caixa Econômica Federal, Vivo, Bradesco Card, Banco do Brasil e Itaucard.
As 10 mais reclamadas
Oi – 653 (9,93%)
Energisa – 441 (6,71%)
Cagepa – 315 (4,79%)
Tim – 289 (4,4%)
Claro – 265 (4,03%)
Caixa Econômica Federal – 244 (3,71%)
Vivo – 173 (2,63%)
Bradesco Card – 123 (1,87%)
Banco do Brasil – 114 (1,73%)
Itaucard – 90 (1,37%)
O secretário do Procon-JP, Helton Renê, considera que os números do
SAC do Procon-JP este ano são altos e mostram que a relação de consumo
ainda é muito problemática. “Apesar da legislação que protege o
consumidor e das campanhas educativas que realizamos semanalmente, o
fornecedor ainda desrespeita muito os direitos do consumidor. O lado
positivo é que nossa divulgação das leis consumeristas junto ao cidadão
está surtindo efeito. Ele hoje está mais atento”.
Serviços essenciais – O titular do Procon-JP chama a atenção para os números das empresas fornecedoras de serviços essenciais como luz e água.
“Há 10 anos, não víamos esses setores no topo da lista das mais
reclamadas, como a Energisa, por exemplo. Isso é preocupante porque são
serviços essenciais e, via de regra, o consumidor reclama porque está
sendo prejudicado mesmo. Baseado nesses números vamos promover algumas
ações para alertar e tentar coibir as irregularidades que provocam
tantas reclamações. Os números são o diagnóstico dessa relação,
portanto, vamos tomar providências”.
Fala consumidor – O funcionário público Francisco de Assis da
Silva, 61, esteve no SAC do Procon-JP no último dia 12 de julho para
reclamar contra a operadora de telefonia Tim. O motivo foi a cobrança de
uma fatura após cancelamento de um plano. “Cancelei o plano no
início de maio e em junho veio uma conta para eu pagar. Como não paguei,
as ligações de cobrança chegam a toda hora”, explica Francisco.
Será resolvido – Antônio Coelho Neto, consultor jurídico do
Procon-JP que atendeu Francisco da Silva, informou que abriu processo
administrativo contra a operadora de telefonia porque não conseguiu
resolver a questão pelo telefone. “Como ele cancelou o plano e
pagou a fatura no início de maio e o vencimento seria no dia 15, então
entendemos que não existe saldo devedor. Acredito que na audiência de
conciliação tudo será resolvido”.
Telefonia soma mais – Má prestação do serviço, cobrança indevida
nas faturas, multas altas quando da desistência ou cancelamento do plano
ou da linha, são as principais reclamações contra as empresas de
telefonia. Helton Renê adianta que “em nossa lista das 10 empresas
mais reclamadas, temos as quatro de telefonia, com mais de 20% entre as
que constam na relação das 10 mais. As 10 juntas somam 2.707
reclamações nos seis primeiros meses deste ano”.
Água e luz – As reclamações quanto aos serviços de água e luz são basicamente os mesmos. “Muita
gente vem aqui reclamar de cobrança indevida devido a erros nas
leituras dos medidores e os clássicos pedidos de intermediação quanto a
parcelamentos de contas atrasadas porque, na maioria das vezes, o
parcelamento oferecido pelas empresas fica muito pesado para o
consumidor”, informou Helton Renê.
Velho problema – Os problemas mais relatados pelos consumidores
em relação aos bancos é quanto às cobranças abusivas de juros e multas
por serviços que não são requeridos pelos clientes, além da reclamação
contra o tempo gasto nas filas. “Os bancos continuam a descumprir a
legislação e as reclamações sobre tempo de espera ainda é bem presente.
É o velho problema do descumprimento da Lei das Filas”, explica o secretário.
Politicaetc
terça-feira, 23 de julho de 2019
segunda-feira, 22 de julho de 2019
Versículos do dia
Faze-nos voltar, Senhor Deus dos Exércitos; faze resplandecer o teu rosto, e seremos salvos.
E Jesus lhe disse: Vê; a tua fé te salvou.
E logo viu, e seguia-o, glorificando a Deus. E todo o povo, vendo isto, dava louvores a Deus.
domingo, 21 de julho de 2019
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